quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O dia em que eu mordi Jesus Cristo

Ruth Rocha

Eu estava numa escola onde não tinha aula de religião. E todos os meus amigos já tinham feito a primeira comunhão, menos eu. Então, me deu uma vontade danada de fazer primeira comunhão. Eu nem sabia direito o que era isso, mas falei pra minha mãe e pro meu pai e eles acharam que até podia ser bom, que eu andava muito lavada e coisa e tal, e me arranjaram uma tal de aula de catecismo, que era na igreja.
Aí eu não gostei muito, que todo sábado de manhã, enquanto meus amigos ficavam brincando na rua, eu tinha que ir na tal aula. Eu ia, né, e aí eu arranjei uns amigos e tinha uma menina boazinha que vinha me buscar que ela também ia na aula e a gente ia pra igreja rindo de tudo que a gente via.
E na aula a gente aprendia uma porção de coisas, e tinha uma que eu achava engraçada e que era uma rezinha bem curtinha, que se chamava jaculatória. Eu achava esse nome meio feio, sei lá, me lembrava alguma coisa esquisita...
E o padre uma vez mostrou pra gente um livrão, que tinha uma figura com o inferno e uma porção de gente se danando lá dentro.
E a gente tinha que aprender a rezar a Ave-Maria e o Padre-Nosso e o Creindeuspadre.
E tinha um tal de ato de contrição, e uma tal de ladainha, que a gente morria de rir.
E aí a gente começou a aprender como é que se confessava, que tinha que dizer todos os pecados pro padre e eu perguntava pro padre o que era pecado e ele parece que nem sabia direito.
Quando eu chegava em casa e contava essas coisas, meu pai e minha mãe meio que achavam graça e eu comecei a achar que esse negócio de primeira comunhão era meio engraçado...
E aí o padre começou a explicar pra gente como era a comunhão e que a gente ia comer o corpo de Cristo, que na hora da missa aquela bolachinha chamada hóstia vira o corpo de Cristo.
Eu estava muito animada era com o meu vestido novo, que era branco e era cheio de babados e rendas, e na cabeça eu ia botar um véu, que nem a minha avó na missa, só que o meu era branco e mais parecia uma roupa de noiva.
E eu ganhei um livro de missa lindo, todo de madrepérola, e um terço que eu nem sabia usar, minha mãe disse que antigamente as pessoas rezavam terço, mas que agora não se usava mais...
E o dia da comunhão estava chegando e a minha mãe preparou um lanche, ia ter chocolate e bolo e uma porção de coisas, que a gente ia voltar bem depressa da igreja, que quem ia comungar não ia poder comer antes da missa. E era só eu que ia comungar.
E eu perguntei pra minha mãe por que é que ela nunca comungava e ela disse que um dia desses ela ia.
E eu perguntei por que é que o meu pai nunca ia na igreja e ele disse que um dia desses ele ia.
E aí chegou a véspera da minha comunhão e eu tive de ir confessar. E eu morri de medo de errar o tal ato de contrição e na hora que eu fui confessar mandaram eu ficar de um lado do confessionário, que é uma casinha com uma janelinha de grade de cada lado e um lugar de cada lado para ajoelhar, e o padre fica lá dentro.
Eu ajoelhei onde me mandaram e aí eu ouvia tudo que a menina do outro lado estava dizendo pro padre e era que ela tinha desobedecido a mãe dela e o padre mandou rezar vinte Ave-Marias.
Eu fiquei meio que achando que era pecado ouvir os pecados dos outros, mas como ninguém tinha falado nada pra mim eu fiquei quieta, e quando o padre veio pro meu lado eu fui logo falando o ato de contrição: eu pecador me confesso e o resto que vem depois.
E eu contei os meus pecados, que pra falar a verdade eu nem achava que eram pecados, mas foi assim que me ensinaram. E aí o padre disse uma coisa que eu não entendi e eu perguntei “o quê” e o padre disse "vai tirar o cera do ouvido”. E eu disse “posso ir embora?” e ele disse “vai, vai logo e reze vinte Ave-Marias”. E eu achei que ele nem tinha escutado o que eu disse e que ele que precisava tirar a cera do ouvido.
No dia seguinte eu botei o meu vestido branco e eu não comi nadinha, nem bebi água, e nem escovei os dentes, de medo de engolir uma aguinha.
E eu estava morrendo de medo, que todo mundo tinha dito que se a gente mordesse a hóstia saía sangue.
A igreja cheirava a lírio, que é um cheiro que até hoje eu acho enjoado.
As meninas e os meninos que iam fazer primeira comunhão ficavam lá na frente, nos primeiros bancos e davam pra gente uma vela pra segurar.
O padre foi rezando uma missa comprida que não acabava mais e às tantas chegou a hora da gente comungar e as meninas foram saindo dos bancos e foram indo lá pra frente e ajoelhando num degrau que tem perto de uma grade.
E o padre veio vindo com uma taça dourada na mão e ele tirava a hóstia lá de dentro e ia dando uma por uma para cada menina e menino.
Aí chegou a minha vez e abri bem a boca e fechei os olhos que nem eu vi as outras crianças fazerem e o padre botou a hóstia na minha língua. Eu não sabia o que fazer, que morder não podia e a minha boca estava sequinha e a hóstia grudou no céu da boca eu empurrava com a língua e não desgrudava e enquanto isso eu tinha que levantar e voltar pro meu lugar que já tinha gente atrás de mim querendo ajoelhar.
E eu nem aprestei atenção e tropecei no vestido da Carminha e levei o maior tombo da minha vida.
É claro que eu fiquei morrendo de vergonha e eu levantei e nem prestei atenção se eu tinha machucado o joelho. O que estava me preocupando mesmo é que eu tinha dado a maior mordida na hóstia.
Eu estava sentindo tudo que é gosto na boca, que devia de estar saindo sangue da hóstia, mas não tinha coragem de pegar pra olhar.
Aí eu pensei assim: “se eu não olhar se saiu sangue agora, nunca mais na minha vida eu vou saber se é verdade essa história”.
Aí eu meti o dedo na boca e tirei um pedaço da hóstia, meio amassado, meio molhado. E estava branquinho que nem tinha entrado.
E foi assim que eu aprendi que quando as pessoas falam pra gente coisas que parecem besteira não é pra acreditar, que tem muita gente besta neste mundo!


Fábulas fabulosas – O nascer do Capitalismo (à Maneira dos … Americanos)?

Um homem tinha uma fazenda perto de um rio. Certo dia, o rio começou a subir e ele percebeu que sua fazenda ia ficar submersa.

Transferiu toda sua família e todo seu gado e todos seus utensilios e móveis para o alto da montanha mais próxima. Havia, na sua fazenda, exatamente 284 km de cerca de arame farpado. Era um arame de sete farpas por metro, num total de sete mil farpas por quilômetro e, portanto, toda cerca somava 1.988.000 farpas. O homem arranjou um empregado e, sem comer nem dormir, colocou em cada uma dessas farpas um pedacinho de carne, uma isca qualquer. Quando terminou, ele e o empregado mal tiveram tempo de subir a montanha. Veio o dilúvio.

Durante 93 horas choveu ininterruptamente. Durante 96 horas o rio esteve três metros acima da cerca. Mas logo as águas cederam, e rapidamente o rio voltou ao normal. O homem desceu e examinou a cerca. Encontrou, maravilhado, um peixe pendente de cada farpa, exceto três. Ou seja, um total de 1.981.997 peixes. Havia tainhas, e havia robalos, corvinas, namorados, galos e muitas outras spécies que ele nunca vira(1). Cada peixe pesava, em média 250 g, de modo que o homem tinha um total de 496.999.250 g de peixe fresco, ou seja, 496.999 kg. de peixe. Isso tudo, vendido a 10 cruzeiros o quilo, vocês façam a conta e …

Ah, naturalmente o empregado foi despedido, porque colocou mal as iscas nas três farpas que faltaram.

Moral: O operariado deve ter o máximo cuidado com as iscas do Capitalismo.


Árvore Genealógica



-        Mãe, vou casar! 
-        Jura, meu filho ?! Estou tão feliz! Quem é a moça? 
-        Não é moça. Vou casar com um moço. O nome dele é Júlio. 
-        Você falou Júlio... Ou foi meu cérebro que sofreu um pequeno surto psicótico? 
-        Eu falei Júlio. Por que, mãe? Tá acontecendo alguma coisa? 
-        Nada, não... Só minha visão que está um pouco turva. E meu coração, que talvez dê uma parada. No mais, tá tudo ótimo. 
-        Se você tiver algum problema em relação a isto, melhor falar logo... 
-        Problema? Problema nenhum. Só pensei que algum dia ia ter uma nora... Só isso. 
-        Você vai ter uma nora. Só que uma nora... Meio macho. 
-        Ou um genro meio fêmea. Resumindo: uma nora quase macho, tendendo a um genro quase fêmea...
-        E quando eu vou conhecer o meu. A minha... O Júlio? 
-        Pode chamar ele de Biscoito. É o apelido. 
-        Tá! Biscoito... Já gostei dele. Alguém com esse apelido só pode ser uma pessoa bacana. Quando o Biscoito vem aqui? 
-        Por quê? 
-        Por nada. Só pra eu poder desacordar seu pai com antecedência. 
-        Você acha que o Papai não vai aceitar? 
-        Claro que vai aceitar! Lógico que vai. Só não sei se ele vai sobreviver... Mas isso também é uma bobagem. Ele morre sabendo que você achou sua cara-metade. E olha que espetáculo: as duas metade com bigode. 
-        Mãe, que besteira ... Hoje em dia ... Praticamente todos os meus amigos são gays. 
-        Só espero que tenha sobrado algum que não seja... Pra poder apresentar pra tua irmã. 
-        A Bel já tá namorando. 
-        A Bel? Namorando ?! Ela não me falou nada... Quem é o felizardo? 
-        Uma tal de Veruska. 
-        Como? 
-        Veruska... 
-        Ah! bom! Que susto! Pensei que você tivesse falado Veruska. 
-        Mãe!!! !!!... 
-        Tá. Tá..., tudo bem...Se vocês são felizes. Só fico triste porque não vou ter um neto...
-        Por que não? Eu e o Biscoito queremos dois filhos. Eu vou doar os espermatozoides. E a ex-namorada do Biscoito vai doar os óvulos.
Ex-namorada? O Biscoito tem ex-namorada? 
-        Quando ele era hétero... A Veruska. 
-        Que Veruska? 
-        Namorada da Bel.... 
-        "Peraí". A ex-namorada do teu atual namorado... E a atual namorada da tua irmã. Que é minha filha também. Que se chama Bel. É isso? Porque eu me perdi um pouco... 
-        É isso. Pois é.... A Veruska doou os óvulos. E nós vamos alugar um útero. 
-        De quem? 
-        Da Bel. 
-        Mas. Logo da Bel ?! Quer dizer então... Que a Bel vai gerar um filho teu e do Biscoito. Com o teu espermatozoide e com o óvulo da namorada dela, que é a Veruska. 
-        Isso. 
-        Essa criança, de uma certa forma, vai ser tua filha, filha do Biscoito, filha da Veruska e filha da Bel. 
-        Em termos... 
-        A criança vai ter duas mães: você e o Biscoito. E dois pais: a Veruska e a Bel. 
-        Por aí... 
-        Por outro lado, a Bel...., além de mãe, é tia…. Ou tio... Porque é tua irmã. 
-        Exato. E ano que vem vamos ter um segundo filho. Aí o Biscoito é que entra com o espermatozoide. Que dessa vez vai ser gerado no ventre da Veruska...
-        Com o óvulo da Bel. A gente só vai trocar. 
-        Só trocar, né? Agora o óvulo vai ser da Bel. E o ventre da Veruska. 
-        Exato! 
-        Agora eu entendi! Agora eu realmente entendi... 
-        Entendeu o quê? 
-        Entendi que é uma espécie de swing dos tempos modernos! 
-        Que swing, mãe ?!!.... 
-        É swing, sim! Uma troca de casais... Com os óvulos e os espermatozoides, uma hora no útero de uma, outra hora no útero de outra... 
-        Mas... 
-        Mas uns tomates! Isso é um bacanal de última geração! E pior... Com incesto no meio. 
-        A Bel e a Veruska só vão ajudar na concepção do nosso filho, só isso... 
-        Sei !!! ... E quando elas quiserem ter filhos... 
-        Nós ajudamos. 
-        Quer saber? No final das contas não entendi mais nada. Não entendi quem vai ser mãe de quem, quem vai ser pai de quem, de quem vai ser o útero, o espermatozoide... A única coisa que eu entendi é que... 
-        Que...? 
-        Fazer árvore genealógica daqui pra frente... vai ser foda. 

Luiz Fernando Veríssimo



Anacleto, um sujeito quase completo...

Anacleto era um sujeito quase completo
Ele sabia de quase tudo...
Fazia quase tudo certo.
Ninguém fazia contas tão bem quanto Anacleto.
Ele não se atrapalhava com os números,
nunca errava as somas.
Anacleto era o melhor aluno da escola,
o corredor mais rápido da rua
e também um craque de bola.
Anacleto fazia piruetas na bicicleta,
nadava como um peixe...
E era radical no skate.
Anacleto era um verdadeiro atleta.
Anacleto andava sempre arrumado, camisa limpinha, sapato engraxado,
cabelo penteado, nariz sem meleca.
A Mônica, a Bia e a Teca, ele já tinha namorado.
Anacleto falava bonito.
Conhecia palavras como EXATAMENTE
e IMPRESSIONANTE.
Era realmente um sujeito brilhante.
Anacleto sabia o triplo de cinco,
sabia o que provocava relâmpagos e de onde vêm os bebês.
Sabia até o que é ORNITORRINCO.
Mas, apesar de tão esperto,
era um sujeito quase completo.
Sabem por quê?
Anacleto não sabia de tudo não:
ele não sabia fazer bolinha de sabão...

CISALPINO, Murilo; TEIXEIRA, Zeflavio. Anacleto, um sujeito quase completo.


TRAIÇÃO DE MINEIRO

O amigo chega pro Carzeduardo e fala:
- Carzeduardo, sua muié tá te traino co Arcide.
- Magina !!! Ela num trai eu não. Cê tá inganado, sô.
- Carzeduardo !!! Toda veiz que ocê sai pra trabaiá, o Arcide vai pra sua casa e prega ferro nela.
- Duvido !!! Ele num teria corage.
- Mais teve !!! Pode cunfiri.
Indignado com o que o amigo diz, o Carzeduardo finge que sai de casa, sesconde dentro do guarda-roupa e fica olhando pela fresta da porta.
Logo vê sua mulher levando o Arcide para dentro do quarto pra começar a sacanage.
Mais tarde, ele encontra com o amigo, que lhe pergunta o que houve.
E então, o Carzeduardo relata cabisbaixo:
- Foi terrive di vê !!!... Ele jogou ela na cama, tirou a brusa... E os peito caiu... Tirou a carcinha... E a barriga e a bunda dispencaro...
Tirou as meia... E apariceu aquelas varizaiada toda, as perna tudo cabiluda.
E eu dentro do guarda-roupa, cas mão no rosto, pensava: 'Ai... Qui vergonha que tô do Arcide!!!'





Charges: pra rir um pouco...








UMA DAS DE PEDRO MALASARTES


Um dia, Pedro Malasartes foi ter com o rei e lhe pediu três botijas de azeite, prometendo-lhe levar em troca três mulatas moças e bonitas. O rei aceitou o negócio. Pedro saiu e foi ter à casa de uma velha, ali pela noitinha; pediu-lhe um rancho, e que lhe botasse as botijas no poleiro das galinhas. A velha concordou com tudo. Alta noite, Pedro Malasartes levantou-se, foi de pontinha de pé ao poleiro, quebrou as botijas, derramou o azeite, lambuzando as galinhas. De manhã muito cedo Malasartes acordou a velha, e pediu-lhe as botijas de azeite. A velha foi buscá-las, e, achando-as quebradas, disse: "Pedro, as galinhas quebraram as botijas e derramaram o azeite".
– Não quero saber disso, - disse Pedro; - quero para aqui meu azeite, senão quero três galinhas.
A velha ficou com medo, deu-lhe as três galinhas. Malasartes partiu e foi à noite à casa de outra velha; pediu rancho e que agasalhasse aquelas três galinhas entre os perus. A velha, como tola, consentiu. Alta noite, Pedro se levantou, foi ao quintal, matou as três galinhas, besuntando de sangue os perus. No dia seguinte, bem cedo, acordou a velha, pedindo as suas galinhas, porque queria seguir viagem. A velha foi buscá-las e encontrou o destroço. Voltou aflita, contando a Malasartes.
Ele fez um grande barulho até levar seis perus em troca das galinhas. Na noite seguinte, foi ter à casa de um homem que tinha um chiqueiro de ovelhas, e pediu-lhe para passar a noite em sua casa e que lhe agasalhasse aqueles perus lá no chiqueiro das ovelhas, porque bicho com bicho se acomodavam bem. O homem assim fez.
Tarde da noite, Pedro foi ao lugar onde estavam os perus, e matou-os a todos, labreando de sangue as ovelhas. O homem, indo-os buscar, achou-os mortos, e voltou muito aflito, dizendo: "Pedro, não sabe, as ovelhas mataram os seus perus". Ouvindo isto, Malasartes fez um grande espalhafato, gritando que o homem tinha morto os perus do rei e recebeu seis ovelhas pelos perus. Largou-se, indo dormir na casa de um homem que tinha um curral de bois. Aí ele fez as mesmas artimanhas, até pegar seis bois pelas seis ovelhas.
Mais adiante, ele encontrou uns vendilhões de ouro e trocou os bois por ouro. Mais adiante encontrou uns homens que iam carregando uma rede com um defunto. Pedro perguntou quem era, diserram-lhe que era uma moça. Ele pediu para ir enterrá-la e eles deram.
Logo que os homens se ausentaram, ele tirou a moça da rede, encheu-a de bastante ouro e de enfeites, e foi ter com ela nas costas à casa de um homem rico que havia ali perto. Pediu rancho, disse às filhas do tal homem que aquela era a filha do rei que estava doente, e ele andava passeando com ela, e pediu que a fossem deitar.
Foram levar a moça para uma camarinha, indo Malasartes com ela, dizendo que só com ele ela se acomodava. Deitou a moça defunta na cama e retirou-se, dizendo às donas da casa: "Ela custa muito a dormir, ainda chora como se fosse uma criança; quando chorar, metam-lhe a correia."
Alta noite, Pedro foi e se escondeu debaixo da cama onde estava a moça e pôs-se a chorar como menino. As moças da casa, supondo ser a filha do rei, deram-lhe muito até ela se calar, que foi quando Pedro se calou. Depois ele escapuliu e foi para o seu quarto.
De manhã ele pediu a moça, que queria ir-se embora. Foram ver a filha do rei, e nada de a poderem acordar. Afinal conheceram que ela estava morta, e vieram dar parte a Malasartes. Ele pôs as mãos na cabeça dizendo: "Estou perdido; vou para a forca; me mataram a filha do rei!…"
Os donos da casa ficaram muito aflitos, e começaram a oferecer cousas pela moça, e Pedro sem querer aceitar nada, até que ele mesmo exigiu três mulatas das mais moças e bonitas. O homem rico as deu, e Pedro disse que dava uma desculpa ao rei sobre a morte de sua filha, e lhe dava de presente as três mulatas, para o rei não se agastar muito.
Malasartes largou-se e foi logo para o palácio, onde entregou o rei as três mulatas com este dito: "Eu não disse a vossa majestade que lhe dava três mulatas pelas três botijas de azeite? Aí estão elas". O rei ficou muito admirado.
Entrou por uma porta,
Saiu por outra;
Manda o rei, meu senhor,
Que me conte outra.

(In: ROMERO, Sílvio. Contos populares do Brasil)

CURRICULUM VITAE

Redação feita por um candidato num processo de seleção. Não sei se ele foi aprovado, mas seu texto está fazendo sucesso e ele com certeza será sempre lembrado pela sua criatividade, sua poesia e, acima de tudo, pela sua alma.  Vale a pena ler. O nome dele não aparece, infelizmente.

Eu já dei risada até a barriga doer, já nadei até perder o fôlego, já chorei até dormir e acordei com o rosto desfigurado. Já fiz cosquinha na minha irmã só pra ela parar de chorar, já me queimei brincando com vela. Eu já fiz bola de chiclete e melequei todo o rosto, já conversei com o espelho, e até já brinquei de ser bruxo. Já quis ser astronauta, violonista, mágico, caçador e trapezista. Já me escondi atrás da cortina e esqueci os pés pra fora. Já passei trote por telefone, já tomei banho de chuva e acabei me viciando. Já roubei beijo, Já fiz confissões antes de dormir num quarto escuro pro melhor amigo. Já confundi sentimentos,
Peguei atalho errado e continuo andando pelo desconhecido. Já raspei o fundo da panela de arroz carreteiro, já me cortei fazendo a barba apressado, já chorei ouvindo música no ônibus. Já tentei esquecer algumas pessoas, mas descobri que essas são as mais difíceis de se esquecer. Já subi escondido no telhado pra tentar pegar estrelas, já subi em árvore pra roubar fruta, já caí da escada de bunda. Conheci a morte de perto, e agora anseio por viver cada dia. Já fiz juras eternas, já escrevi no muro da escola, já chorei sentado no chão do banheiro, já fugi de casa pra sempre, e voltei no outro instante. Já saí pra caminhar sem rumo, sem nada na cabeça, ouvindo estrelas. Já corri pra não deixar alguém chorando, já fiquei sozinho no meio de mil pessoas sentindo falta de uma só.
Já vi pôr-do-sol cor-de-rosa e alaranjado, já me joguei na piscina sem vontade de voltar, já bebi uísque até sentir dormentes os meus lábios, já olhei a cidade de cima e mesmo assim não encontrei meu lugar. Já senti medo do escuro, já tremi de nervoso, já quase morri de amor, mas renasci novamente pra ver o sorriso de alguém especial. Já acordei no meio da noite e fiquei com medo de levantar. Já apostei em correr descalço na rua, já gritei de felicidade, já roubei rosas num enorme jardim. Já me apaixonei e achei que era para sempre, mas sempre era um "para sempre" pela metade. Já deitei na grama de madrugada e vi a Lua virar Sol, já chorei por ver amigos partindo, mas descobri que logo chegam novos, e a vida é mesmo um ir e vir sem razão. Foram tantas coisas feitas, momentos fotografados pelas lentes da emoção, guardados num baú, chamado coração.
E agora um formulário me interroga, me encosta na parede e grita: "- Qual sua experiência?"
Essa pergunta ecoa no meu cérebro: "Experiência... experiência..." Será que ser "plantador de sorrisos" é uma boa experiência? Não!!! Talvez eles não saibam ainda colher sonhos!
Autor desconhecido
                                                                             

O PODER DE UM TELEFONEMA

O cara liga pra casa numa tarde para saber o que a esposa vai fazer para o jantar.
- Alô? - diz uma voizinha de criança.
- Oi, querida, é o papai. Mamãe está perto do telefone?
- Não, papai. Ela está lá em cima no quarto com o tio Chico.
Após alguns segundos, o cara diz:
- Mas querida, você não tem um tio chamado Chico!!!
- Sim, eu tenho! E ele está lá em cima no quarto com a mamãe.
- Tá bom, então quero que você faça o seguinte: suba correndo as escadas, bata na porta do quarto e grite para a mamãe e para o tio Chico que meu carro acabou de parar na frente de casa.
- Tá legal, papai.
Alguns minutos depois, volta a menina:
- Eu fiz o que você disse, papai.
- E o que aconteceu?
- Bem, a mamãe pulou da cama pelada e começou a correr pelo quarto gritando, tropeçou no tapete e caiu pela janela da frente, e agora ela está morta...
- Oh, meu Deus!!! E o tio Chico? –
- Ele pulou da cama pelado também, estava muito assustado, e pulou pela janela do fundo para dentro da piscina, mas ele deve ter esquecido que você esvaziou piscina na semana passada para limpar, daí ele bateu a cabeça no fundo dela, e agora está lá, morto também...
Uma longa pausa... e o cara diz:
- Piscina??? Por acaso o telefone dai é 3555-0739???
- Não!
- Desculpe, foi engano!!!