Shirlene Álvares
Beto
era um menino esperto, mas muito desconfiado. Desconfiava de tudo, inclusive
das verdades que as pessoas diziam, mas ele não duvidava de coisas simples,
questionava sempre sobre assuntos profundos. Chegou a ganhar várias feiras de
ciências na escola, porque sua curiosidade o fazia procurar, descobrir,
experimentar.
As
coisas mais banais, ditas pelos mais velhos deixava Beto curioso, queria sempre
saber o porquê delas.
Um
dia, ele começou a questionar o pai, a mãe de onde veio o ser humano. Beto
ainda era novo, mas seus pais falavam sempre de Deus, da origem da vida.
Esclareciam para Beto como Adão e Eva surgiram na Terra. Mas, Beto não
acreditava em nada disso. Não acreditava no Paraíso, nem no céu.
Como
quem duvida, ele duvidava mesmo, sempre dizia coisas do tipo:
-
Tá! A mulher nasceu da costela de Adão? O céu é um paraíso. E como é esse
paraíso? O inferno tem cheiro de enxofre? E tem fogo por todos os lados? Sei...
E
ria de tudo! E como ele implicava com quem acreditasse nisso tudo. Beto gostava
de provas. Pra tudo que lhe diziam, ele retrucava – quero provas!
Para
Beto, acreditar na vida precisava ver a vida nascer, como no parto de seu irmão
menor. Na escola, os professores já nem davam contar de responder as perguntas
que fazia. E ele era um excelente aluno!
Quando
sua mãe lhe disse que o maior segredo da vida era a morte, que só depois que
morresse saberia a verdade sobre a vida, ele ria, um riso debochado, porque
para ele, depois da morte, não haveria mais vida.
Não
demorou muito, Beto estava com dez anos, quando por causa de uma queda de
bicicleta e a cabeça no meio-fio, acabou morrendo.
O
pior, ou melhor, é que foi parar no paraíso, mas quando chegou ao paraíso,
encontrou logo na entrada um grande portão de madeira, mas parecia uma porteira
de fazenda antiga, mas bem antiga mesmo! No portão da entrada não estava São
Pedro, havia um São Bernardo. Sim! Um cachorrão, bem grande!
Beto
viu que o lugar era maravilhoso! Havia somente bichos, animais de todas as espécies.
Quando se aproximou, o cachorrão rosnou, aliás, falou, (nesta história, animais
falam, ok!). Era um interrogatório, tinha uma ficha a ser preenchida. Beto
respondeu todas as perguntas, mas indagou:
-
Onde estou?
O
cão respondeu:
-
Acabou de chegar ao paraíso.
Beto
riu e protestou – não sabia que no céu tinha animais.
O
cachorro, desta vez, foi manso e cauteloso ao dizer-lhe:
-
Deus, des-a-cre-di-tou dos homens, por causa da maldade e da falta de fé e,
então, aqui, quando os homens chegam, são logo transformados em animais, porque
eles não duvidam e nem questionam a existência de Deus.
Beto
ficou ressabiado. E o São Bernardo, que não era mesmo São Pedro mandou-lhe
entrar logo, senão o diabo viria para buscá-lo. Beto, que não acreditava em
nada disso e duvidava de muita coisa, naquela hora, não duvidou de nada e
entrou rapidinho no céu, porque por via das dúvidas e, ele tinha muitas, sabia
que era melhor o céu do que o inferno.
Quando
já tinha caminhado por entre todo aquele verde, cachoeiras, pastagens, campos
floridos, riachos, montanhas, etc, percebeu que realmente só havia bichos
naquele lugar. Não gostou de ver de longe uma terrível serpente e mais ao longe
um leão imenso. Ficou com medo, mas logo se aproximou dele um papagaio:
-
Curupacopapaco! Você é o novo morador do paraíso?
Beto
fez que sim com a cabeça.
-
Já te contaram que quando os homens chegam aqui, logo viram animais?
-
Então é verdade? – Beto fez a indagação e começou a rir. Ainda não estava
acreditando naquilo tudo.
O
papagaio acompanhou sua risada e começou a apresentar os animais mais graduados
do céu.
-
Tá vendo aquele curió todo emplumado cantarolando?
Beto
fez que sim com a cabeça.
-
É o Pavarotti. Chegou aqui faz pouco tempo, canta o tempo todo. Tem horas não
agüentamos tanta cantoria.
-
E aquela lebre astuta, correndo o tempo todo, sabe quem é? – dessa vez Beto nem
balançou a cabeça. – Era o Ayrton Senna. Aqui ele nunca pára de correr, vive
ganhando todas as corridas, nem os leopardos ganham dele.
Beto
fez que ia apontando para um gato peludo, todo branco, quando o papagaio logo
foi revelando – aquele é o Gandhi, Mahatma Gandhi. – e continuou – Ele veio
parar aqui, porque luta pela não-violência é tão bonzinho!
Beto
estava sem palavras! Não estava acreditando em nada, mas e se fosse verdade? Uma
coisa era certa! Tinha uma multidão de gatos e outros animais seguindo o
gato-Gandhi.
A
cada passo na caminhada de Beto ao conhecer o paraíso, mais surpresas e
descobertas. O papagaio não era o Zé Carioca, das histórias em quadrinhos, mas
dizia-se brasileiro, quando era homem vivente na terra. Beto quis saber quem
ele era, mas o papagaio só repetia: você saberá, você saberá!
Quando
estavam se aproximando de um imenso mar, de cima de um elevado morro, Beto avistou
vários golfinhos, tinha um que mergulhava à frente, liderava o grupo. E, antes
que Beto perguntasse quem era, o papagaio foi logo dizendo:
-
Lembra daquele político brasileiro que morreu no mar, um acidente de
helicóptero? – fez-se um silêncio, para que Beto tentasse se lembrar – É ele, o
Ulisses Guimarães. Agora, vive numa paz! Aqui as águas não representam perigo
algum para sua vida.
E,
foi assim, a cada passo dado, descobertas de pessoas importantes, que agora
eram animais irracionais. E, tinha mais... quando Beto viu uma enorme onça
pintada, apavorou-se, mas o papagaio revelou-lhe:
-
Curupacopapaco! Não tema, você ainda não percebeu que os animais daqui têm uma
grande diferença dos animais da terra? Aqui, não há predadores, os animais são
todos herbívoros.
Como
o garoto poderia imaginar animais ferozes que só se alimentam de vegetais?
Fauna e Flora se completando!
Mas,
Beto começou a ficar curioso, o que terá sido feito do tio Ronald, que falecera
há um ano atrás? E descobriu que seu tio, que adorava futebol, agora era um
cavalo selvagem, vivia em bandos, pelas campinas...
A
surpresa maior, para Beto, foi quando viu um lobo – sabia que não era o lobo
mau que pega crianças pra fazer mingau – devia ter sido um lobo muito esperto,
mas também muito importante tamanha sua imponência. E nem precisou tentar
adivinhar, porque via que o lobo tinha pele de cordeiro e que estava ajudando,
convivendo muito bem com os porquinhos. E sabem que era ele? Martin Luther
King. Éééé! Nesta história, líderes do bem continuavam liderando para o bem.
Tinha
muitas outras personalidades e Beto se surpreendeu foi quando num recanto
florido de pastagens verdejantes, viu lindos pássaros, de todas as espécies,
raros ou não, mas que olhavam para a águia que voava mais alto. E o papagaio
não resistiu. Essa é Maria, a mãe de Jesus. Aqui, ela é a mãe de todos. Quando
algum animal fica triste é ela que do alto, de sua sabedoria, alegra e devolve
a harmonia para cada animal, foi dela a idéia de que Deus não mais
classificasse os animais em seu reino. E, foi então que Deus acabou com as diferenças.
Mesmo os que antes eram carnívoros, roedores e até mesmo insetos, todos se
alimentam de plantas. E todos se alimentam o suficiente para manter-se
saudável.
Beto
queria saber mais, fez muitas perguntas, mas queria descobrir quem tinha sido o
papagaio, antes de se tornar um bicho. E o papagaio sobrevoo a cabeça de Beto
repetindo e repetindo “ó Terezinha, ó Terezinha...” e não precisou dizer mais
nada. Beto sabia que era o tal Chacrinha.
De
repente, Beto começou a se transformar em um belo macaco, gênero que o
aproximaria da espécie humana, já que era muito incrédulo, rolou de um lado
para o outro, por causa da metamorfose e caiu da cama.
-
Mãe, mãe! – Beto correu para a cozinha e viu que havia tido um sonho.
O
sonho fez Beto começar a acreditar naquilo que não vê, mas pode sentir, a ter
fé no sobrenatural, porque afinal, se o sonho o fez imaginar algo tão irreal,
era porque a realidade não é tão racional assim, existem razões e emoções, que nem
sempre você deve acreditar só no que pode provar e ver, mas deve também
acreditar no que o coração sente e não pode pegar.
Depois
desse sonho, muitas outras coisas mudaram na vida de Beto, inclusive, nunca
mais acreditou que o homem era descendente de macaco...
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