terça-feira, 25 de novembro de 2008

Humor

Chico “Mão Leve”, Ibraim Dital e Manuel assaltaram um supermercado no subúrbio e fugiram pro interior do Brasil, uma cidade bem pequena, onde ninguém podia botar a mão neles. Chico era carioca. Ibraim não era e Manuel tinha vindo de Trás-os-Montes. 
Acontece que o delegado da região onde eles praticaram o assalto era um homem muito vivo, muito exigente, muito detalhista e não ia deixar as coisas ficarem assim. 
Em poucos dias tinha descoberto o paradeiro dos três malandros. 
Dois dias depois, ele recebeu um telegrama do colega: 
 “Prazê informá nóis prendeu os ladrão.” 
 O delegado ficou muito satisfeito com a eficiência do outro, mas passou-lhe um telegrama nos seguintes termos: 
 “Parabéns pelo trabalho pt Corrija o português pt” 
 Dizem que o pobre do Manuel está apanhando até hoje. 

 Ziraldo

Vai - de Ivan Ângelo

Quer ir? Vai. Eu não vou segurar. 
Uma coisa que não dá certo é segurar uma pessoa contra a vontade, apelar pro lado emocional. De um jeito ou de outro isso vira contra a gente mais tarde: não fui porque você não deixou, ou: não fui porque você chorou. Sabe, existem umas harmonias em que é bom a gente não mexer. Estraga a música. Tem a hora dos violinos e tem a hora dos tambores. Eu compreendo, compreendo perfeitamente. 
Olha, e até admito: você muda pra melhor. Fora de brincadeira, acho mesmo. Eu sei das minhas limitações, pensei muito nisso quando tava tentando te entender. É, é um defeito meu, considerar as pessoas em primeiro lugar. Concordo. Mas não tem mais jeito, eu sou assim. Paciência. Sabe por que eu digo que você muda pra melhor? 
Ele faz tanta coisa melhor do que eu! Verdade. Tanta coisa que eu não aprendi por falta de tempo, de oportunidade - ora, pra que ficar me justificando? 
Não aprendi por falta de jeito, de talento, essa é que é a verdade. 
Eu sei ver as qualidades de uma pessoa, mesmo quando é um homem que vai roubar minha namorada. Roubar não: ganhar. Compara. Ele dança muito bem, até chama a atenção. Campeão de natação, anda de bicicleta como um acrobata de circo, é bom de moto, sabe atirar, é fera no volante, caça e acha, monta a cavalo, mete o braço, pesca, veleja, mergulha... Não tem companhia melhor. Eu danço mal, você sabe. Não consegui ultrapassar aquela fronteira larga entre a timidez e a ousadia, entre a discrição e o exibicionismo, que separa o mau e o bom bailarinos. 
Nunca fui muito além daquela fase em que uma amiga compadecida precisava sussurrar no meu ouvido: dois pra lá, dois pra cá. Atravessar uma piscina eu atravesso, uma vez, duas talvez, mas três? Menino de cidade, e modesto, não tive córrego nem piscina. É com olhos invejosos que eu o vejo na água, afiado como se tivesse escamas. Moto? Meu Deus, quem sou eu. Pra ser bom nisso é preciso ter aquele ar de quem vai passar roncando na frente ou por cima de todo mundo - e esse ar ele tem. 
 O jeito como ele dirige um carro é humilhante. Já viajei com ele, encolhido e maravilhado. Você conhece o jeitão, essa coisa da velocidade. Não vou ter nunca aquela noção de tempo, a decisão, o domínio que ele tem. Cada um na sua. Eu troquei a volúpia de chegar rapidinho pelo prazer de estar a caminho. 
No amor também. Aí é que eu tou perdido mesmo, no capítulo da coragem. Ele faz e acontece, já vi. Mas eu? Quantas vezes já levei desaforo pra casa. Levei e levo. Se um cachorro late pra mim na rua, vou lá e mordo ele? Eu não. Mudo de calçada. Vai. Olha, não quero dizer que o que eu vou falar agora tenha importância pra você, que possa ter influído na sua decisão, mas ele tem mais dinheiro também, você sabe. Ele tem até, sabe?, aquele ar corajoso dos ricos, aquela confiança de entrar nos lugares. Eu não. Muito cristal me intimida. 
Os meus lugares são uns escondidos onde o garçom é amigo, o dono me confessa segredos, o cozinheiro acena lá do quadradinho e me reserva o melhor naco. É mais caloroso, mas não compensa o brilho, de jeito nenhum. Ele é moderno, decidido. Num restaurante não te oferece primeiro a cadeira, não observa se você tá servida, não oferece mais vinho. Combina, não é?, com um tipo de feminismo. 
A mulher que se sente, peça o que quiser, sirva-se, chame o garçom quando precisar. Também não procura saber se você tá satisfeita. Eu sei que é assim que se usa agora. Até no amor. Já eu sou meio antigo, ultrapassado, gosto de umas cortesias. Também não vou dizer que ele é melhor do que eu em tudo. Isso não. Eu sei por exemplo uns poemas de cor. 
Li alguns livros, sei fazer papagaio de papel, posso cozinhar uns dois ou três pratos com categoria, tenho certa paciência pra ouvir, sei uma ótima massagem pra dor nas costas, mastigo de boca fechada, levo jeito com crianças, conheço umas orquídeas, tenho facilidade pra descobrir onde colocar umas carícias, minhas camisas são lindas, sei umas coisas de cinema, não bato em mulher. E não sou rancoroso. Leva a chave para o caso de querer voltar.

FELICIDADE CLANDESTINA


Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.
Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade".
Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.
Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato. Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E, completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.
Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança de alegria: eu não vivia, nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam.
No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.
Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono da livraria era tranqüilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte" com ela ia se repetir com meu coração batendo.
E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra.
Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.
Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!
E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: "E você fica com o livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais do que me dar o livro: "pelo tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.
Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.
Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.

PERFUME DE MÃE


Esta é uma história de muitos anos atrás sobre uma professora primária. Seu nome era Dona Hilária. E enquanto estava em frente de sua classe da 5ª série, no primeiro dia de aula, disse uma mentira a seus alunos. Como muitas professoras, ela olhou para seus alunos e disse que os amava igualmente. Mas isto era impossível, pois ali, na 1ª carteira, estava sentado um garotinho chamado Luiz Alberto.
Dona Hilária já o havia observado no ano anterior e notou que ele brincava muito com as outras crianças, que suas roupas estavam amarrotadas e que ele constantemente precisava de um banho, além de que, às vezes, podia ser grosseiro. Chegou a um ponto em que a dona Hilária sentia prazer em apontar os erros nos seus trabalhos de casa e fazer grandes “X” com caneta vermelha, apresentando a ele um grande “F”.
Na escola onde Dona Hilária ensinava era obrigatória a pesquisa da vida escolar das crianças e ela colocou Luizinho por último. Mas quando finalmente ela pesquisou o currículo escolar dele, ficou surpresa.
A professora da 1ª série escreveu: “Luiz Alberto é uma criança brilhante e alegre. Ele faz suas tarefas bem feitas e sempre estão limpas. Tem boas maneiras. É uma alegria estar ao lado dele”.
A professora da 2ª série escreveu: “Luiz Alberto é um excelente aluno. É bem visto pelos colegas, mas está com alguns problemas, pois sua mãe está com câncer terminal e dentro de casa está sendo difícil”.
A professora da 3ª série escreveu: “A morte de sua mãe tem sido muito difícil para Luiz Alberto. Ele tenta fazer o melhor, mas seu pai não mostra muito interesse para a vida caseira e logo isto vai afetá-lo se alguma providência não for tomada”.
A professora da 4ª série escreveu: “Luiz Alberto está se retraindo e não mostra muito interesse para a escola. Ele não tem muitos colegas e às vezes dorme durante a aula”.
Neste momento a Dona Hilária percebeu o problema e envergonhou-se.
Ela sentiu-se pior quando os seus alunos trouxeram-lhe presentes de Natal, embrulhados em papéis bonitos com laços, com exceção de Luiz Alberto. Seu presente, que estava mal embrulhado em papel de supermercado era notado no meio dos outros. Algumas crianças começaram a rir quando, ao abrir o presente, a professora encontrou um bracelete de pedras com algumas faltando, e um vidro de perfume quase no fim. Mas, ela fez com que os alunos se calassem enquanto dizia como era bonito o presente que acabara de receber. Ela colocou o bracelete e também um pouco do perfume.
Luiz Alberto ficou após a aula na escola apenas para encontrar a Dona Hilária e dizer a ela: “Professora, hoje eu senti a fragrância de minha mãe na senhora.”
Depois que as crianças foram para a casa, ela chorou por uma hora. Naquele mesmo dia ela parou de ensinar leitura, escrita, aritmética. Em vez disso, ela começou a ensinar crianças.
Dona Hilária deu mais atenção a Luiz Alberto. Enquanto ela trabalhava com ele, a mente dele parecia vivida. Quanto mais ela o encorajava, mais rápido ele respondia. No fim daquele ano Luiz Alberto se tornou o melhor aluno da classe e, desta vez, ele se tornou o favorito dela.
Um ano depois ela encontrou um bilhete debaixo de sua porta, que era de Luiz Alberto, dizendo que ela ainda era a melhor professora que ele já teve.
Seis anos se passaram e ela recebeu um outro bilhete de Luiz Alberto. Ele escrevia que havia terminado o colegial e era o 3º melhor aluno da classe e que a Dona Hilária era sua professora preferida e a melhor que ele havia tido.
Quatro anos depois disto ela recebeu outro bilhete de Luiz Alberto, dizendo que as coisas às vezes ficaram difíceis, mas que continuou estudando e que muito em breve ele se formaria na faculdade com honras. Ele assegurou à Senhora Hilária que ela ainda era a melhor professora que ele havia conhecido.
Aí, mais quatro anos se passaram e uma outra carta chegou. Desta vez ele explicou que quando recebeu o bacharelado, decidiu ir um pouco mais longe. A carta explicava que ela continuava a ser a melhor professora e também a sua favorita. Mas, agora, o nome dele era um pouco maior: Dr. Luiz Alberto Pereira da Silva.
A história não termina aqui. Uma outra carta acabou de chegar nesta primavera. Luiz Alberto disse que havia conhecido a garota com quem irá se casar. Ele disse que seu pai havia falecido e que ele gostaria que a Dona Hilária sentasse no lugar de sua mãe durante a cerimônia do casamento.
 A Dona Hilária aceitou e, adivinhe o que aconteceu? Ela compareceu usando o bracelete que ele lhe deu e também o perfume que sua mãe gostava. Eles se abraçaram e Dr. Luiz Alberto cochichou no ouvido da Dona Hilária: “Obrigado por acreditar em mim. Obrigado por me fazer sentir importante e mostrar que eu podia fazer a diferença”.
A Dona Hilária, com lágrimas nos olhos cochichou também: “Luiz Alberto, você está errado. Você é quem ensinou que eu podia fazer a diferença. Eu não sabia ensinar até que conheci você”.

MOTO BOY



E aí tudo bem pessoal?
Eu sou moto boy né!
Como vocês podem ver tal!
Meu nome é Jackson Five!
É... i....
Eu vim aqui entregar uma coisa no programa do Jô, né.
E agora eu queria aproveitar a situação pra lançar um dilema pra vocês: o que a gente não pode detê-los, junte-se a eles. Entendeu?
Não! Isso é em relação a essa Megalópoles, né, tipo São Paulo, Nova York, Macxu Picthu. Essas cidades grandes, onde tem lance dos carros versus motos, né, porque, na real mesmo, você, vocês queria se livrar de nós, mas não vão!
Nós viemo pra ficar maluco! Nóis se prolifera. Entendeu? Morre 14 no dia, mas chega 30 na gangue. Mas pra falar a verdade mesmo na real, nóis também não queria que vocês existissem. Imagina a rua sem motos e sem carros?
Quem faz o trânsito são os carros, nóis costura. Mas quer se livrar de nóis mesmo? Deixa nóis passar. É só isso que nóis quer: passar. Vai um pouquinho mais pra cá... um pouquinho mais pra lá... ó fuhhhh, nóis passa, prometo que nem buzininha eu não dou. É chato buzininha, né! Irrita, é ou não é?
Imagina-os ne mim? Que você ouvem uma minha, eu ouço todas as minhas.
E aí a gente pega cada um... não vou genealizar não: mas você pega um tiozinho: o tiozinho tá aqui, ele acha, o sonho dele é morar no interior, né! Aí ele acha que ele já ta lá! Então ele ta aqui né fufuufu, pá vai trocar de narcha, né! Pó nessa ele já comeu meia pista! Se eu não buzino eu me ferro né! Aí vocês reclama que nóis quebra retrovisor. Nóis não quebra retrovisor! Nóis só retira os que não são utilizados.
Oh! Vou deixar um dilema, vou deixar um dilema aí pra vocês flexionarem:
- O que é a cidade vista de cima? De cima do viaduto, né, não é lá de cima não! A cidade é uma ferida encrustrada na crosta terrestre. Um organismo pulsante, memo! As avenidas são as artérias, as ruas são as veias, com os glóbulos vermelhos indo e vindo, indo e vindo... os faróis dos carros, né! Aí você pensa o que que é o moto boy? Bactéria? Vírus? Não, não é não! NÓS SOMOS LACTO BACILO VIVO.

 Grupo: Terça Insana

A importância de ouvir, falar, ler e escrever para a aprendizagem

Antes mesmo do nosso nascimento, a mãe, geradora da vida, já nos envolvia no mundo da linguagem, ou quando conversava conosco em seu ventre, em momentos de emoção, ou quando nos proporcionava carinho com meigas melodias e músicas e, até passando sua mão sobre a barriga. Todas as sensações eram vividas por nós, o feto intra-uterino. Uma vida que se envolava a partir de outra vida. Ao nascermos, a audição foi sendo aguçada e estimulada, pela voz da mãe, do pai e das outras pessoas que nos cercavam. Ouvir passou a ser estímulo ao ato da fala. Ouvir e falar são os antecedentes do mundo da leitura e da escrita. Estas atividades humanas que pressupõem as nossas relações com as outras pessoas: ou a oralidade, ou a escrita. Há quem defenda a concepção de que a linguagem é comunicação, o exercício da língua que falamos. Outros defendem a concepção de que a linguagem é a expressão do pensamento humano, mas este também pode ser exteriorizado por meio dos gestos, como o é para os mudo-surdos, mas para os analistas do discurso, a linguagem é interação humana, pois é por meio dela que nos interagimos com o Outro. E quem é o Outro? Para entendermos quem é esse Outro, devemos compreender que a Linguagem pode ser oral ou escrita: uma relação entre o sujeito que fala ou escreve com o sujeito que ouve ou lê. Ao assistirmos a televisão, o(s) seu(s) Outro(s) são os atores, os repórteres, os jornalistas, os apresentadores. Se você está lendo um texto escrito, seja no jornal, na revista, no livro da escola, no cartaz publicitário, no outdoor, na placa do trânsito, o Outro está representado pela pessoa que o escreveu, que enunciou o discurso escrito. Em ambos os casos, houve linguagem, pois aconteceu a interação humana entre um emissor e um receptor: de quem falou com quem ouviu, de quem leu com quem escreveu e num só código, a Língua Brasileira. Estudar a nossa língua pressupõe essa competência para saber falar, saber ouvir, saber ler e saber escrever com clareza e fluência para que qualquer leitor ou ouvinte da mensagem possa de fato compreendê-la. Vejamos: eu estou aqui agora teclando em meu computador, escrevendo sobre este assunto, que você irá ler. Neste caso, eu sou a emissora e você é meu receptor. Eu não sei quem você é, mas escrevi para que você com capacidade leitora e tantos outros possam ler e compreender o que estou falando, digo, escrevendo. Paulo Freire escreveu e proferiu em palestras, que antes da leitura da palavra, o homem já traz para a escola, seja adulto analfabeto ou criança ainda não alfabetizada, a leitura do mundo, que tem sua origem nas experiências de vida. Muitos homens e mulheres, por exemplo, nunca estudaram, não sabiam ler e escrever, mas sabem contar, sabem identificar uma dúzia, fazem leitura de placas. A leitura não envolve somente a leitura da palavra escrita, mas também dos gestos, das expressões faciais, dos símbolos, dos desenhos, da pintura, da escultura, da arte como um todo. A semiótica que é a ciência que investiga todas as linguagens possíveis tem como objetivo o exame dos modos de constituição de toda e qualquer linguagem seja artística ou não, como fenômeno de produção de significação e de sentido. Então, se você boceja durante uma missa ou culto, abrindo a boca, quem está do seu lado vai interpretar que você está com sono. Se o seu filho chega correndo na sala e você está com uma visita importante, mas sem perceber ele entra chorando e gritando palavras grosseiras, você dá aquela olhada de lado fecha o semblante e seu filho logo entende que você não gostou do comportamento dele. Um quadro, uma pintura, um filme no cinema ou na televisão, tudo que seja representado pela arte, pela oralidade ou pela escrita são objetos de estudo da semiótica. Os seres humanos só falam bem e escrevem bem, quando lêem ou escutam bons textos e discursos, com a linguagem da norma culta da língua. O adolescente que só fala gíria, que não lê e não escreve constantemente, não poderá, por conseqüência, produzir bons discursos orais ou escritos. A linguagem bem escrita e bem falada só advém do leitor e do ouvinte de linguagem bem elaborada tanto na oralidade como na escrita. Ler jornal significa estar informado por meio da leitura, que busca levar ao leitor uma linguagem clara e possível de ser compreendida. LEIA sempre, mas leia bons textos e se ocupe em ouvir pessoas que falem bem, porque inconscientemente irá assimilando bons discursos que resultarão na concordância e regência das palavras da sua oralidade e escrita. 

Shirlene Álvares é professora universitária de Língua e Literatura Brasileira, Contadora de Histórias do Centro de Estudo e Pesquisa “Ciranda da Arte” e do Grupo GWAYA. e-mail: shialvares@gmail.com

Como será daqui pra frente?

Uma professora de português pediu à amiga escritora que criasse um conto ou crônica utilizando as novas regras ortográficas para trabalhar com seus alunos adolescentes. A escritora, depois de muito relutar, acabou cedendo aos insistentes apelos da amiga. No dia da apresentação da aula, os alunos estavam mais dispersos que o normal. A professora chegou a pensar em mudar o tópico, mas as férias estavam chegando e a matéria andava atrasada. A professora notou que aos poucos seus alunos participavam da aula, fazendo comentários ou complementando alguma parte do texto. Durante as aulas que vieram depois, surgia um comentário ou outro que trazia a crônica novamente à baila, que era rapidamente integrada à matéria do dia. A turma evoluiu. As provas mostraram que as novas regras ortográficas foram bem assimiladas pela turma, que obteve a melhor média de notas da escola. Outra professora resolveu utilizar a crônica em outra escola. O resultado foi animador. A crônica “Como será daqui pra frente?” “Estive vendo as novas regras da ortografia. Na verdade, já tinha esbarrado com elas trilhares de vezes, mas apenas hoje que as danadas receberam uma educada atenção de minha parte. Devo confessar que não foi uma ação espontânea. Que eu me lembre, desde o ano retrasado que uma amiga me enche o saco para escrever a respeito. O faço com a esperança de que diminua o volume de e-mails e torpedos que ela me envia. Em suma, que as novas regras ortográficas a mantenham sossegada por um bom tempo. Cai o trema! Aliás, não cai... Dá uma tombadinha. Linguiça e pinguim ficam feios sem ele, mas quantas pessoas conhecemos que utilizavam o trema a que eles tinham direito? Essa espécie de "enfeiação" já vinha sendo adotada por 98% da população brasileira. Resumindo, continua tudo como está. Alfabeto com 26 letras? O K e o W são moleza para qualquer internauta, que convive diariamente com Kb e Web-qualquercoisa. A terceira nova letra de nosso alfabeto tornou-se comum com os animes japoneses, que tem a maioria de seus personagens e termos começando com y. Esta regra tiramos de letra. O hífen é outro que tomba, mas não cai. Aquele tracinho no meio das vogais, provocando um divórcio entre elas, vai embora. As vogais agora convivem harmoniosamente na mesma palavra. Auto-escola cansou da briga e passou a ser autoescola, auto-ajuda adotou autoajuda. Agora, pasmem! O que era impossível tornou-se realidade. Contra-indicação, semi-árido e infra-estrutura viraram amantes, mais inseparáveis que nunca. Só assinam contraindicação, semiárido e infraestrutura. Quem será o estraga-prazer a querer afastá-los? Epa! E estraga-prazer, como fica? Deixa eu fazer umas pesquisas básicas pela Internet. Huuummm... Achei! Essas duas palavrinhas vivem ocupadíssimas, cada uma com suas próprias obrigações. Explicam que a sociedade entre elas não passa de uma simples parceria. Nem quiseram se prolongar no assunto. Para deixar isso bem claro, vão manter o traço. Na contra-mão, chega um paraquedista trazendo um paralama, um parachoque e um parabrisa - todos sem tracinho. Joguei tudo no porta-malas pra vender no ferro-velho. O paraquedista com cara de pão de mel ficou nervoso. Só acalmou quando o banhei com água-de-colônia numa banheira de hidromassagem. Então os nomes compostos não usam mais hífen? Não é bem assim. Os passarinhos continuam com seus nomes: bem-te-vi, beija-flor. As flores também permanecem como estão: mal-me-quer. Por se achar a tal, a couve-flor recusou-se a retirar o tracinho e a delicada erva-doce nem está sabendo do que acontece no mundo do idioma português e vai continuar adotando o tracinho. As cores apelaram com um papo estranho sobre estarem sofrendo discriminações sexuais e conseguiram na justiça, o direito de gozarem com o tracinho. Ficou tudo rosa-choque, vermelho-acobreado, lilás-médio... As donas de casa quando souberam da vitória da comunidade GLS, criaram redes de novenas funcionando por 24hs, para que a feira não se unisse sem cerimônia aos dias da semana. Foram atendidas pelo próprio arcanjo Gabriel que fez uma aparição numa das reuniões, dando ordens ao estilo Tropa de Elite: - Deixe o traço! Deu certo. As irmãs segunda-feira, terça-feira e as demais, mantiveram o hífen. Os médicos e militares fizeram um lobby, gastaram uma nota preta pra manter o tracinho. Alegaram que sairia mais caro mudar os receituários e refazer as fardas: médico-cirurgião, tenente-coronel, capitão-do-mar. Uma pequena pausa para a cultura, ocasionada pelo trauma de ler muitas pérolas do Enem e Vestibular. Só por precaução... Almirante Barroso não tem tracinho. Assim era chamado Francisco Manuel Barroso da Silva. Sim, o cara era militar da Marinha Imperial. Foi ele quem conduziu a Armada Brasileira à vitória na Batalha do Riachuelo, durante a Guerra da Tríplice Aliança. No centro do Rio de Janeiro há uma avenida com seu nome (Av. Almirante Barroso). Na praia do Flamengo, há um monumento, obra do escultor Correia Lima, em cuja base se encontram os seus restos mortais. Fim da pau. Acho que algumas regras pra este tracinho, até que simpático, foram criadas por algum carioca apaixonado. Será que Thiago Velloso e André Delacerda tiveram alguma participação nas novas regras? O R no início das palavras vira RR na boca do carioca. Não pronunciamos R (como em papiro, aresta e arara), pronunciamos RR (como em ferro, arraso e arremate). Falamos rroldana e não roldana, rrodopio e não rodopio, rrebola e não rebola. Pois bem, numa das tombada do hífen, o R dobra e deixa algumas palavras com jeito carioca de ser: autorretrato, antirreligioso, suprarrenal. Será fácil lembrar desta regra. Se a palavra antes do tracinho (nem vou falar em prefixo) terminar com vogal e a palavra seguinte começar com R é só lembrar dos simpáticos e adoráveis cariocas. Mais uma coisinha: a regra também vale para o S. Fico até sem graça de comentar isso, pois todos sabemos que o S é um invejoso que gosta de imitar o R em tudo. Ante-sala vira antessala, extra-seco vira extrasseco e por aí vai... Quem segurou mesmo o hífen, sem deixá-lo cair, foram os sufixos terminados em R, que acompanham outra palavra iniciada com R, como em inter-regional e hiper-realista. Estes tracinhos continuarão a infernizar os cariocas. O pré-natal esteve tão feliz, rindo o tempo todo com o pós-parto de uma camela pré-histórica que ninguém teve coragem de tocar no tracinho deles. Já o pró - um chato por natureza foi completamente ignorado. Só assim manteve o tracinho: pró-labore, pró-desmatamento. A vogal e o h não chegaram a nenhum acordo, mesmo com anos de terapia. Permanecem de cara virada um pro outro: anti-higiênico, anti-herói, anti-horário. Estou começando a achar que as vogais são semi-hostis com as consoantes... O interessante é que as vogais quando estão próximas umas das outras, não tem essa de arquiinimigas. Fizeram lipo juntas e conquistaram uma silhueta antiinflacionária de microorganismo. Sumiram todos os tracinhos, notaram? Vogal-vogal, com as novas regras ficam magrinhas: microondas, antiibérico, antiinflamatório, extraescolar... Uma inovação interessante: - Podem esquecer o mixto, ele foi sumariamente despedido. Puseram o misto no lugar dele. Fiquei bolada com essa exceção: o prefixo co não usa mais hífen. Seguiu os exemplos de cooperação e coordenado, que sempre estiveram juntas. Não estou me lembrando no momento, de nenhuma palavra que use co com tracinho. Será que sempre escrevi errado? Quem diria que o créu suplantaria a ideia!? Teremos que nos acostumar com as ideias heroicas sem o acento agudo. Rasparam também o acento da pobre coitada da jiboia. O acento do créu continua porque tem o U logo depois. Pelo menos a assembleia perdeu alguma coisa... Resta o consolo em saber que continuamos vivendo tendo um belíssimo céu como chapéu.” Crônica “Como será daqui pra frente?” De: Elida Kronig

domingo, 2 de novembro de 2008

Como elaborar um Projeto Interdisciplinar de Leitura

Apesar de o currículo dos cursos contemplarem um leque de disciplinas de outras áreas (multidisciplinaridade), muitas vezes como disciplinas optativas, a estrutura disciplinar impede que os respectivos docentes se articulem e articulem seus conhecimentos.





A transdisciplinaridade é a busca do sentido da vida através de relações entre os diversos saberes (ciências exatas, humanas e artes) numa democracia cognitiva. É uma busca do conhecimento globalizante, rompendo com as fronteiras das disciplinas. Integrar conhecimentos apenas não é suficiente, é necessária uma postura e atitudes interdisciplinares. Atitudes de busca, envolvimento, compromisso, reciprocidade diante do conhecimento. Nos projetos educacionais a interdisciplinaridade se baseia em alguns princípios, entre eles: 
1o- Na noção de tempo: o aluno não tem tempo certo para aprender. Não existe data marcada para aprender. Ele aprende a toda hora e não apenas na sala de aula. 
 2º- Na crença de que é o indivíduo que aprende. Então, é preciso ensinar a aprender, a estudar etc. ao indivíduo e não a um coletivo amorfo. Portanto, uma relação direta e pessoal com a aquisição do saber. 
3º- Embora apreendido individualmente, o conhecimento é uma totalidade. O todo é formado pelas partes, mas não é apenas a soma das partes. É maior que as partes. 
 4º- A criança, o jovem e o adulto aprendem quando têm um projeto de vida e o conteúdo do ensino é significativo para eles no interior desse projeto. Aprendemos quando nos envolvemos com emoção e razão no processo de reprodução e criação do conhecimento. 
A biografia do aluno é, portanto, a base do seu projeto de vida e de aquisição do conhecimento e de atitudes novas. A metodologia do trabalho interdisciplinar implica em: 
 1º- integração de conteúdos; 
 2º- passar de uma concepção fragmentária para uma concepção unitária do conhecimento; 
 3º- superar a dicotomia entre ensino e pesquisa, considerando o estudo e a pesquisa, a partir da contribuição das diversas ciências; 
 4º- ensino-aprendizagem centrado numa visão de que aprendemos ao longo de toda a vida. A ação pedagógica através da interdisciplinaridade aponta para a construção de uma escola participativa e decisiva na formação do sujeito social. A visão transdisciplinar é completamente aberta, pois, ela ultrapassa o domínio das ciências exatas pelo seu diálogo e sua reconciliação não somente com as ciências humanas, mas também com a arte, a literatura, a poesia e a experiência interior. 
 Quando falamos em interdisciplinaridade, estamos de algum modo nos referindo a uma espécie de interação entre as disciplinas ou áreas do saber. Todavia, essa interação pode acontecer em níveis de complexidade diferentes. E é justamente para distinguir tais níveis que termos como multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade foram criados. Segundo os PCN, A interdisciplinaridade supõe um eixo integrador, que pode ser o objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um plano de intervenção. Nesse sentido, ela deve partir da necessidade sentida pelas escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários (BRASIL, 2002, p. 88-89, grifo do autor). 
A prática da interdisciplinaridade possui uma linha de trabalho integradora que pode agregar um objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um plano de intervenção. Quando problematizamos uma situação, o problema causador do projeto, pode ser uma experiência, um desencadeamento de ação para interferir na realidade. Devemos nos conscientizar que o projeto é interdisciplinar em sua compreensão, cumprimento e avaliação. 
 A interdisciplinaridade envolve a contextualização do conhecimento, que mantém uma relação fundamental entre o sujeito que aprende e o componente a ser aprendido, evocando fatos da vida pessoal, social e cultural, principalmente o trabalho e a cidadania. 
Quando os alunos participam da tomada de decisão a respeito de um tema ou de um projeto, é possível que constituam relações entre os novos conteúdos e os conhecimentos que já possuem, conseguindo aprendizagens mais significativas, comparando, criticando, sugerindo ajustes, novas relações e organizações, abrindo portas para a interferência em uma realidade, desencadeamento novas ações e, construindo um compromisso com uma cidadania ativa. 
A melhor maneira de fazer com que isso aconteça é através da interdisciplinaridade, que deve ir além da simples justaposição de disciplinas, ao interagimos em busca de objetivos comuns. Devemos através do trabalho pedagógico arrolar as disciplinas em atividades ou projetos de estudo, projetos de pesquisa e ação. 
A interdisciplinaridade poderá ser uma prática pedagógica e didática eficaz ao cultivarmos um diálogo constante de questionamento, de aprovação, de indeferimento, de acréscimo, e de transparência de percalços não apontados. 
Na interdisciplinaridade os alunos aprendem a visão do mesmo objeto sob prismas distintos, daí podermos utilizar a contação de histórias como um gerador de projetos interdisciplinares. Pois a história, sempre carrega vários conteúdos e conhecimentos, que podem ser explorados pelo professor ou por vários professores na escola. A intertextualidade é “um fenômeno constitutivo da produção do sentido e pode-se dar entre textos expressos por diferentes linguagens” (Silva, 2002). 
O professor deve, então, investir na idéia de que todo texto é o resultado de outros textos. Isso significa dizer que não são “puros”, pois a palavra é dialógica. Quando se diz algo num texto, é dito em resposta a outro algo que já foi dito em outros textos. 
Dessa forma, um texto é sempre oriundo de outros textos orais ou escritos. Por isso, é imprescindível que o professor leve o aluno a perceber isso. Assim, a utilização da intertextualidade deve servir para o professor não só conscientizar os alunos quanto à existência desse recurso como também utilizar um modo mais criativo de verificar a capacidade dos alunos de relacionarem textos. A intertextualidade ocorre em diversas áreas do conhecimento. 
À exemplo na literatura: Casimiro de Abreu “Meus oito anos” e Oswald de Andrade “Meus oito anos”. Aquele foi escrito no século XIX e este foi escrito no século XX. Portanto, o 2 texto cita o 1, estabelecendo com ele uma relação intertextual. 
 Meus oito anos Oh! 
Que saudade que tenho 
 Da aurora da minha vida, 
Da minha infância querida 
 Que os anos não trazem mais 
 Que amor, que sonhos, que flores 
 Naquelas tardes fagueiras 
 À sombra das bananeiras 
 Debaixo dos laranjas! 
 
Casimiro de Abreu 


 Meus oito anos Oh! 
Que saudade que tenho 
 Da aurora da minha vida, 
 Da minha infância querida 
 Que os anos não trazem mais 
Naquele quintal de terra 
 Da rua São Antônio 
 Debaixo da bananeira 
 Sem nenhum laranjais! 

 Oswald Andrade 

Para a elaboração de um projeto interdisciplinar de leitura, sugerimos: 
Elaboração de Projeto Interdisciplinar de Leitura 
1. Escolha da obra ou tema a ser abordado no livro literário escolhido. 
2. Elaboração do projeto em equipe. 
3. Estudo da obra, para destacar os elementos chaves que serão desenvolvidos ao longo da realização do projeto. 
4. Divisão de tarefas entre os docentes. 
5. Escrita e revisão do projeto. 
6. Apresentação do projeto ao corpo discente da escola (turmas envolvidas). 

 O Projeto deve ter os seguintes tópicos: 
I. Título do Projeto 
II. Objetivos ( no máximo 5) 
III. Conteúdo (especificar o conteúdo de acordo com os seguintes tópicos voltados para a obra, já que é um projeto interdisciplinar de leitura) 
1- Leitura (tipo de Texto que vai ser explorado) 
2- Competências Lingüísticas (o que poderá ser explorado de Linguagem – conhecimento gramatical) 
3- Produção de Textos (que trabalho será desenvolvido como produção textual a partir da obra) 
4-Temas Transversais (quais temas transversais poderão ser trabalhados) 
São eles: Orientação Sexual, Saúde, Trabalho, Consumo, Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente 
5- Interdisciplinaridade (que relação há entre este textos e outros textos) 
6- Que atividades poderão ser trabalhadas que se relacionam com outros conhecimentos: matemática, ciências, geografia, educação artística, etc. 
IV. Público Alvo Série – turmas – faixas etárias 
V. Proposta – Descrição da ação Passo-a-passo da execução do projeto (como será realizado) 
VI. Produto Final e Avaliação Que atividade será o ponto culminante do projeto e como será avaliada (que tópicos comporão a avaliação). 
VII. Proponentes Equipe elaboradora do projeto. 
Relatório Final do Projeto.

Contar Histórias - origem e histórico

A arte de contar histórias se desenvolveu desde os primórdios da humanidade, sendo intensificada na Grécia Antiga e nas histórias do Império Árabe – “As Mil e Uma Noites”, contadas por Sherazade, que circulam da Pérsia (séc. X) para o Egito (séc. XII), alcançando a Europa somente no (séc. XVIII). 
Sob a magia do contar, desafiando a imaginação do sultão, Sherazade salva a própria vida e a vida do reino, conquistando o coração de Shariar, pois como sabia ser ele um homem muito curioso, ela usava da contação das histórias um meio para sobreviver por mais uma noite. 
Todas as noites, começava uma história nova e só terminava seu enredo no dia seguinte... e por mil e uma noites conseguiu salvar a própria pele, ao fim das quais já tinha três filhos com o sultão, que resolveu poupá-la da morte. Mas só no século XVIII é que autores se voltaram para a produção de histórias infantis com os Irmãos Griim e Hans Cristhian Andersen. 
As primeiras histórias eram contos de fadas, em que a psicanálise dos contos se voltava para a formação ideológica da educação infantil, tinham pro objetivo educar as crianças. Após a Renascença, os contos maravilhosos perdem algumas características, e esse valor retorna somente no séc. XIX com as fábulas de La Fontaine. 
Hoje, e, principalmente, no Brasil temos um grande acervo que foge do mundo da psicanálise, partindo para a realidade e fantasia do mundo das crianças. Autores como Monteiro Lobato, Ana Maria Machado, Bartolomeu Campos Queiroz, Ruth Rocha, Marina Colasanti, Celso Sisto, e outros... é que vêm preconizando o desejo de desenvolver na criança pelo lúdico - o conhecimento. Pois, foi com este objetivo que Monteiro Lobato criou suas histórias, com cunho puramente didático. 
O uso da contação de histórias tem encontrado um espaço bastante amplo. Percebendo as inúmeras possibilidades de envolver a escola na leitura, pensando na importância da leitura prazerosa, integrada em todas as disciplinas, a contação de histórias, envolvida de significados e aprendizados. 

 SILVA, Shirlene Álvares

Qualidades de um bom reitor

Esta reportagem foi publicada no Diário da Manhã no dia 31 de outubro, página 14. QUALIDADES DE UM BOM REITOR Para escolher um bom reitor para a UEG, ou qualquer outra universidade, devemos considerar: O currículo do candidato e, no caso das universidades brasileiras, que seja pelo menos mestre (vamos valorizar nossa condição de educadores); As experiências de professor de ensino superior em cursos diferentes e disciplinas variadas, o que demonstra conhecimento e ensejo por estudo e pesquisa; Participação em projetos de pesquisa, de ensino e de extensão universitária; Conhecimento não somente da política das universidades estaduais, mas um conhecimento amplo em legislação das faculdades, centros universitários, universidades estaduais e federais; Um bom reitor deve conhecer toda a estrutura da universidade que vai administrar e, neste caso, inclusive de toda a legislação pertinentes a ela: estatutos, regimentos, legislações de Ensino Superior dos Conselhos Estadual e Nacional de Educação, documentos do CRUB, documentos da ABRUEM; Saber a importância da Avaliação Institucional e de avaliações como ENADE; Ter domínio e saber falar uma segunda língua é indispensável para um bom reitor; Ter artigos publicados em anais e congressos, trabalhos orientados, participação em bancas, dissertações, tese defendida... são atividades que um reitor não precisa somente conhecer, mas ter na prática a experiência e vivência universitária; Ter monografias orientadas por um reitor é grande importância para a universidade; Reeleger um reitor é um ato político, de escolha e autenticidade, mas a reflexão sobre em quem votar deve independer dos temores: Ai! Vou perder meu cargo! Porque a Universidade não é você, você é que faz parte da Universidade. O intelectual não pensa em si, (ato egoístico), mas pensa na instituição. E a Instituição é composta de pessoas, como eu e você. Uma forma de mudar o futuro da UEG está ao nosso alcance. É bem simples. Basta um voto. Basta escolhermos um bom reitor em 31 de outubro. Compare os currículos publicados na Plataforma Lattes dos candidatos em questão: 
Prof. Luiz Antônio Arantes 
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4739297Y6 Prof. 

Augusto Fleury Veloso da Silveira 

http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4700348A6 

Então, antes de se pensar em universidade nova, há que se pensar numa mudança de atitude dos profissionais que integram a universidade. O mais importante é disseminar o conhecimento e contribuir para a formação sólida dos alunos, e não fazer politicagem, ou adquirir o MEDO/RESPEITO de alguns professores, funcionários e acadêmicos. A eleição para Reitor é "democrática". Todos votam. Você acha que eu votaria em pessoa que não me deixe em liberdade para fazer o que eu quero? Portanto a maioria que não faz nada pela Universidade (que não publica, não participa no Ensino, Pesquisa e Extensão como devem, tem outros "bicos" ou prefere ficar em casa e "trabalhar" votaria em um Reitor com capacidade de fazer cobranças? Com certeza, para a UEG, neste momento em que o governo mais fecha portas e janelas, precisamos de um reitor que tenha a visão de pelas frestas achar soluções. Essa pessoa se chama Augusto Fleury Veloso da Silveira. Este é meu entendimento e apoio à sua candidatura, já que como Platão em o Mito da Caverna revela a Sócrates e, este, diz a Glauco: “... Ou, antes, já que o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos.”

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Provérbios

O USO DO CACHIMBO É QUE ENTORTA A BOCA.

QUEM TEM BOCA VAI À ROMA.

FILHO DE PEIXE, PEIXINHO É.

A NECESSIDADE É QUE FAZ O SAPO PULAR.

PARA TODO PÉ TORTO EXISTE UM SAPATO VELHO.

BOI NA TERRA DOS OUTROS BERRA COMO VACA.

QUEM MUITO QUER, TUDO PERDE.

QUEM FOI REI, SEMPRE SERÁ MAJESTADE.

DEIXA ESTAR JACARÉ, QUE A LAGOA HÁ DE SECAR.

NEM TUDO QUE RELUZ É OURO.

O HÁBITO NÃO FAZ O MONGE.

CADA MACACO NO SEU GALHO.

MATO TEM OLHOS E PAREDE TEM OUVIDOS.

SAIU DO ESPETO, CAIU NA BRASA.

domingo, 19 de outubro de 2008

Trava-línguas

Vamos treinar:

A condessa Clarissa da Prússia pensou que era pássaro. Atravessou o espaço e foi até a Rússia sem bússola.

O palhaço dentuço, com a calça do avesso, pra fazer bagunça, teve um acesso de tosse, tropeçou no cadarço, deu um passo em falso e caiu nos braços da moça russa.

O gaiteiro Garibaldi guarda a gaita e gargalha com graça se vê a graça da Graça engraçando toda a praça. 

A Ciça foi até a praça comprar lingüiça pro almoço.

Na pressa tropeçou no cadarço, caiu na poça, ralou o braço e chorou à beça.

O príncipe Petrônio prometeu casar com a princesa Priscila na primavera. Ficou com preguiça, trocou de projeto. A princesa, braba, contratou a bruxa Petronilda pra transformar o príncipe Petrônio em grilo do brejo.

A jibóia, sem juízo, dirigiu a jamanta do Jamelão até Genebra pra jantar com o Jacobino. Há três trecos tristes: treta, trapaça e tramóia.

A Flora do seu Floripes fabrica flores fabulosas e faz fortuna vendendo flores, vendendo rosas, na feira das sextas-feiras.

Gelatina de jiló com gemada e geléia de jerimum com gengibre. - De jeito nenhum! Fico em jejum!

A sobrinha da cegonha fez a façanha de tomar champanha e comer lasanha com um calcanhar na Alemanha e o outro na Espanha.

No início do itinerário um índio viu o rio e viu a Iara e riu que riu olhando a Iara, olhando o rio. O rato roeu a roupa do rei de Roma.

O chinês chique, de chapéu chocante, chegou com um bicho de luxo. Escorregou na graxa, se esborrachou no chão, machucou a coxa. Chocado, teve um chilique, chutou o lixo e xingou o chão.

A cruel criatura cometeu um grande crime: entrou na casa e devorou três vitrolas, pegou trinta pregos no vitrô, trançou o tricô da Cremilda e estragou treze tortas de creme. Credo!

O grilo gritou com voz grossa: - Griselda, você é uma graça!

Pedro jogou uma pedra preta no primo do padre. A pedra quebrou o prato da tia Prudência. Na pressa pra se livrar, tropeçou, se prendeu no prego. Tia Prudência, braba, brigou, e o prestígio do Pedro foi pro brejo. Pobre Pedro.

Fragoso, neto da mariposa Luísa, ficou confuso pra escolher esposa. A Rosa era mimosa mas preguiçosa. A Teresa, de grande beleza, mas dava despesa. A Ardósia era formosa mas melindrosa. Por fim, casou com a Beatriz, que tinha uma cicatriz no nariz e o fez muito feliz.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

O sexo no casamento


Dizem que é verídica... Isso aconteceu no RS (na cidade de Amaral Ferrador). Conheceram-se no casamento do primo Tavinho. Apaixonaram-se e, 4 meses depois, resolveram casar. Duzentas pessoas compareceram à pequena igreja. O padre, visivelmente cansado da viagem, e com a batina amassada começou o sermão:
- A data de hoje é muito importante... Duas pessoas que se amam e se respeitam vão unir-se aos olhos de Deus... Assim como o respeito e o companheirismo, o sexo também é fundamental para uma aliança duradoura.
Os convidados se entreolharam em silêncio, pensando que ia ser só uma menção sob a ótica da procriação.
- O sexo bem feito pode segurar o homem em casa e garantir também a fidelidade da mulher...
A mãe da noiva aperta forte a mão do marido.
- Marcelo, você deve respeitar a vontade da Tatiana quando ela não quiser ter relações... Mas isso não deve ser motivo para desgastes... O que eu sempre recomendo, nessas horas, para meus fiéis, é o prazer solitário... Que dá maiores resultados quando se passa um creminho na face interna da mão. Os convidados reprimem o riso. A mãe da noiva começa a suar dentro do vestido mostarda alugado. O pai ameaça interferir, mas se coloca no seu lugar de cordeiro de Deus e relaxa.
- Tatiana, você não deve se conformar só com a posição "papai e mamãe". Ser ativa, no matrimônio, também é muito importante. Quando seu marido chegar cansado do futebol, por exemplo, você deve ficar por cima dele. Essa posição, além de dar uma folga para o esposo, também é excelente para que a mulher atinja o orgasmo, já que o contato do clitóris com a pélvis do marido é mais intenso. Se você, Marcelo, tiver um pênis muito avantajado, e que Deus o conserve assim, é conveniente que vocês escolham fazer amor de lado. Assim, você evita machucar a sua companheira, sem perder o prazer.
Os convidados deixaram o riso transbordar como água num dique perfurado. Algumas mães, horrorizadas, tampam os ouvidos dos filhos. A essa altura, a mãe da noiva começa a se abanar com as folhas da decoração do altar. O pai olha o relógio na esperança do sermão estar chegando ao fim. Mas o Padre, com a maior naturalidade do mundo, continua:
- Tatiana, para que as relações continuem quentes, você poderá usar o lubrificante íntimo Molhadinha e Discreta da Smart & Helmet ou o famoso KY Gel da Jonhson & Jonhson que são incolores e não tem cheiro... Você também pode encontrar, em sexs shops, alguns lubrificantes de sabores extravagantes como, por exemplo, Piña Colada...
Alguns convidados sentam para rir. Outros, começam a ficar com tesão e loucos para enfiar a mão por debaixo dos vestidos das mulheres. O padre pega o copo de vinho e, dizendo umas palavras em latim, oferece ao casal. A mãe da noiva já começa a apresentar sinais evidentes de tontura e o pai, de taquicardia. Enquanto isso, o padre abençoa a hóstia e a coloca na boca dos noivos, e continua o seu discurso:
- O sexo oral também é muito importante... tanto para o homem quanto para a mulher... Por isso é fundamental que o casal mantenha os seus órgãos sexuais sempre limpinhos e saudáveis. Muitas mulheres, só conseguem atingir o orgasmo através do sexo oral... E, a maioria dos homens, não vive sem um bom chupeteco.
A mãe da noiva faz que vai desmaiar. Os padrinhos também se controlam e, junto com os convidados, começam a rir, enquanto o fotógrafo japonês, de terno listrado, dispara um clique atrás do outro.
Finalmente, o Padre abençoa o casal, introduzindo, em seus dedos, as alianças.
- Se a tentação for muito grande, a infidelidade até será permitida perante o Senhor... Mas nunca sem camisinha ... Aproveito para lembrar que as camisinhas Loló, Hot, Red and Wet e Fuck me Baby foram as únicas que passaram nos testes de qualidade do Inmetro e do Ministério da Saúde. Os convidados podem sentar-se...
Neste instante, um tio da noiva não resistiu e interveio ferozmente.
- Escuta aqui ô seu padre, que diabo de sermão é este? Isto mais parece um manual de sacanagem. Dê por encerrada esta cerimônia imediatamente!!! Pelo jeito tu também deve ser um daqueles padres pedófilos. Cai fora, seu depravado!! E mais, o nome da minha sobrinha não é Tatiana e do noivo não é Marcelo.
Silêncio profundo no altar e no templo... O "padre", agora com um olhar de surpresa, desculpa-se.
- Olha aí gente, não levem a mal não, eu também não sou padre, sou ator, fui contratado por amigos dos noivos pra fazer esta brincadeira, mas acho que errei de casamento!! Mas se serve de consolo, lhes asseguro que essas dicas servem muito bem para todos que moram neste cú de mundo. Fui!!!
Dizem que a cidade de Amaral Ferrador nunca mais foi a mesma...

Luis Fernando Veríssimo

Diário de uma doméstica...

VER-DE-VER-MEU-PAI


CELSO SISTO
A primeira vez que o vi de verdade, ele rasgava papéis. Tão pouco menos menino que eu e já com sobras nos olhos! Naqueles pedaços de carta, cartões e bilhetes, eu via misturarem-se dias, meses e anos de um diário que ele construiu feliz.
Fingi não ver lágrimas. É, fingi, Virei de costas para não intimidá-lo e ele chorou no silêncio. Lá fora a natureza se encarregava de dublá-lo.
E aos poucos eu fui ficando ali, imóvel, apenas para aprender mais sobre ele. Quanto tempo? Talvez o suficiente pare perceber que naquele instante ele começava a crescer aos meus olhos. Minha irmã juraria ter visto um monstro, eu diria apenas ter visto o homem.
No dia seguinte, na escola, o assunto era ecologia. A professora havia falado sobre animais em extinção e, como sempre, pediu uma redação. E eu escrevi:
Meu pai era feito de terra. Terra das Minas Gerais, que eu preferia acreditar que eram Minas Individuais, porque eram só dele, muito dele.
Estava no seu jeito de falar:
- Ara, menino! Deixa de revestrés!
Estava nas brincadeiras que ele me ensinava:
- Dia, compadre!
- Dia comadre!
- Os patinho tão bom?
- Vão bem, obrigado.
- Qué  que eles come?
- Milho cuzido.
- Qué que eles bebe?
- Água do rio Fonfom da cor de limão de Nossa Senhora da conceição!
Que era o modo dele me dizer que em Minas ele foi o que eu sou hoje. E que lá, pisando descalço a terra, ele tinha criado raízes.
E de tanto ele falar isso, eu acreditei que ele era árvore, e foi só notar as marcas no seu rosto para entender que a árvore trocava as folhas e que, enfim, era outono no rosto do meu pai.
E ele regava a terra quando os olhos se enchiam d’água. Que vinha mansamente lavando tudo, deixando o olhar limpo para ver o depois.
E eu nadava no rio que ele derramava, confiando que ele viria ao menor pedido de socorro!
Pai, não me deixe sozinho!
E ele era um rio de margens largas, de onde a gente espiava o mundo que cabia nos seus olhos.
Mas meu pai também era fogo! Quando queria, queimava a gente com o olhar. Bastava minha mãe reclamar:
Esses meninos hoje ainda não pararam de brigar!
Aí não havia água que apagasse aquele incêndio. E ele não botava fogo em palavras! Fogo pelos olhos era mais forte. Queimava mais. Impedia o tapa e a surra, mas obrigava a gente a pensar sobre o erro.
Meu pai era ar quando ria redondo. Enchia a sala com seu sopro, e tudo virava um grande balão:
Vem vento caxinguelê, cachorro do mato quer me morder!
Assim soprando vida, ele devolvia ao nosso mundo a brisa que, depois de caminhar por dentro dele, passava para nos fazer cafuné. Nesse tempo suas folhas eram de veludo.
Hoje meu pai foi ser natureza em outro lugar. Dizem que sou a cara dele. Um dia vou quebrar esse espelho! Pra libertá-lo da forma e me libertar da dívida!
E foi isso. E minha redação sofreu graves acusações:
- Isso não tem nada a ver com ecologia!
- Eu não sabia que seu pai era bicho!
- Seu pai é árvore, é?
- Você foi achado numa folha de bananeira, aposto! Por isso é que você diz que é filho de árvore!
E eu, que procurava apoio nos olhos da professora, vi que ela estava indignada e sem respostas. Pela primeira vez!
Depois desse dia, passei a andar com um adesivo bem grande colado no caderno:
Preserve a Natureza! Proteja o Homem!

Esquecer para Lembrar

Um amigo meu, nos Estados Unidos, comprou uma casa velha de mais de um século, conservada, como muitas por lá existem. Muitas coisas a serem consertadas. Tudo teria que ser pintado de novo. Antes de pintar com as cores novas ele achou melhor raspar das paredes a cor velha, um azul sujo e desbotado. Raspado o azul, debaixo dele surgiu uma cor rosa mais velha ainda que o azul. Raspou-a também. Aí apareceu o creme, e depois do creme o branco... 
Cada morador havia coberto a cor anterior com uma cor nova. E assim ele foi indo, pacientemente, camada após camada. Queria chegar à cor original, que apareceria depois que todas as camadas de tinta fossem raspadas. Finalmente o trabalho terminou. E o que encontrou foi surpresa inesperada que o encheu de alegria. Mais bonito que qualquer tinta: madeira linda, o maravilhoso pinho-de-riga, com nervuras formando sinuosos arabescos cor castanha contra um fundo marfim. 

Parábola: somos aquela casa. Ao nascer somos pinho-de-riga puro. Mas logo começam as demãos de tinta. Cada um pinta sobre nós a cor de sua preferência. Todos são pintores: pais, avós, professores, padres, pastores. Até que o nosso corpo desaparece. Claro, não é com tinta e pincel que eles nos pintam. O pincel é a fala. A tinta são as palavras. Falam, as palavras grudam no corpo, entram na carne. Ao final o nosso corpo está coberto de tatuagens da cabeça aos pés. Educados. 
Quem somos? “O intervalo entre o nosso desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de nós“, responde Álvaro de Campos. Contra isso lutava Alberto Caeiro: Procuro despir-me do que aprendi. Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram, e raspar a tinta com que me pintaram os sentidos. Desencaixotar minhas emoções verdadeiras. Desembrulhar-me e ser eu, não Alberto Caeiro, mas um animal humano que a natureza produziu. Mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!), isso exige um estudo profundo, uma aprendizagem de desaprender... 
Barthes se descobriu atacado pela mesma doença que afligira Caeiro. 
Através dos anos seu corpo foi coberto por saberes que se sedimentaram sobre sua pele. Agora ele estava enterrado, esquecido de si mesmo. Só havia um caminho: desaprender tudo. “Empreendo, pois“, ele diz, “deixar-me levar pela força de toda forca viva: o esquecimento“. Esquecer é raspar a tinta. Afim de se lembrar do esquecido. E o que ele viu, depois de terminada a raspagem, encantou-o: lá estava a sua alma, o jeito original de saber — “sabedoria“. 
Diz o Tao Te Ching que os saberes podem ser somados (como as camadas de tinta). Mas sabedoria só se obtém por subtração, por raspagem e esquecimento. 

 Rubem Alves

sábado, 11 de outubro de 2008

Estrelas em Greve



Todas as noites, as mulheres se punham diante da televisão para ver as novelas. Os homens cochilavam no sofá e a criançada brincava com os computadores. Ninguém tinha tempo de olhar para o céu.
Sem platéia, as estrelas decidiram entrar em greve por tempo indeterminado. A Lua, solidária com as amigas, aderiu ao protesto e também se escondeu.
Foi um fuzuê no mundo inteiro. As galinhas, que dormiam com a estrela-d’alva, perderam o sono e deixaram de botar ovos. As corujas pararam de piar. Os tatus não saíram mais das tocas. Os grilos silenciaram. Os anjos da guarda, que desciam à noitinha para ninar as crianças, perdiam-se no caminho. As damas da noite não abriram mais suas pétalas. No escuro, o vento não enxergava nada e não sabia para onde soprar. Os poetas caíram em desânimo e a produção de poesia imediatamente cessou. Os agricultores ignoravam se era ou não a época certa para semear. As marés, desorientadas, subiam e desciam à deriva.
Então, os homens descobriram que aquilo tinha a ver com o sumiço das estrelas. Chamaram os melhores astrônomos, mas eles não souberam explicar o ocorrido. Convocaram as feiticeiras para resolver o assunto, elas fizeram lá suas mandingas, mas não adiantou nada. A coisa estava realmente preta.
Até que, numa noite, um homem saiu de casa e se pôs a contemplar o céu na escuridão. Lembrou que a mãe lhe ensinara a posição do Cruzeiro do Sul. Outro se juntou a ele e recordou as histórias de Lua cheia, quando aparecia o lobisomem. Um velho ouviu a conversa dos dois e veio contar que, em criança, tinha visto o Cometa Halley. Apareceu uma mulher e comentou que só cortava os cabelos na Lua minguante. Outra mulher falou que, havia alguns anos, vira uma estrela cadente e fizera um pedido. O marido ouviu-a e disse que o pedido era ter o amor dele para sempre. Outro homem contou que lhe nascera uma verruga no dedo porque, quando garoto, apontara para as Três-Marias. Aos poucos, as pessoas foram saindo de casa e cada uma tinha sua história para contar sobre a Lua e as estrelas.
Quanto estavam todos na rua olhando o céu vazio, as estrelas, que os observavam do fundo da noite, apareceram de surpresa, acendendo-se ao mesmo tempo. Foi lindo: parecia uma chuva de gotas prateadas. Em seguida, despontou a Lua, com seu brilho magnífico, como um holofote.
Aí todos entenderam o motivo daquela greve. E, imediatamente, decidiram em consenso: podiam ver televisão, dormir no sofá e brincar com o computador todas as noites. Mas, de vez em quando, iriam dar uma espiadinha no céu para ver o show das estrelas.
Conto de João A. Carrascoza. Ilustrado por Ivan Zigg

Aí tem

As coisas são como são. Se alguém diz que está calmo, é porque está calmo. Se alguém diz que te ama, é porque te ama. Se alguém diz que não vai poder sair à noite porque precisa estudar, está explicado. 
Mas a gente não escuta só as palavras: a gente ouve também os sinais. Ele telefonou na hora que disse que ia ligar, mas estava frio como um iglu. Você falava, falava, e ele quieto, monossilábico. 
Até que você o coloca contra a parede: “O que é que está havendo?” “Nada, tô na minha, só isso.” “Só isso???? Aí tem.” Ele telefonou na hora que disse que ia ligar, mas estava exaltado demais. Não parava de tagarelar. Um entusiasmo fora do comum. 
Você pergunta à queima-roupa: “Que alegria é essa?” “Ué, tô feliz, só isso.” “Só isso????? Aí tem.” 
Os tais sinais. Ansiedade fora de hora, mudez estranha, olhar perdido, mudança no jeito de se vestir, olheiras e bocejos de quem dormiu pouco à noite: aí tem. 
Somos doutoras em traduzir gestos, silêncios e atitudes incomuns. Se ele está calado demais, é porque está pensando na melhor maneira de nos dar uma má notícia. 
Se está esfuziante demais, é porque andou rolando novidades que você não está sabendo. 
Se ele está carinhoso demais, é porque não quer que você perceba que está com a cabeça em outra. 
Se manda flores, é porque está querendo que a gente facilite alguma coisa pra ele. 
Se vai viajar com os amigos, é porque não nos ama mais. 
Se parou de fumar, é uma promessa que ele não contou pra você. Enfim, o cara não pode respirar diferente que aí tem. Às vezes não tem. 
O cara pode estar calado porque leu um troço que mexeu com ele, ou está falando muito porque o time dele venceu. 
Pode estar mais carinhoso porque conversou sobre isso na terapia e pode estar mais produzido porque teve um aumento de salário. 
Por que tudo o que eles fazem tem que ser um recado pra gente? 
É uma generalização, mas as mulheres costumam ser mais inseguras que os homens no quesito relacionamento. Qualquer mudança de rota nos deixa em estado de alerta, qualquer outra mulher que cruze o caminho dele pode ser uma concorrente, qualquer rispidez não justificada pode ser um cartão amarelo. 
O que ele diz importa menos do que sua conduta. Pobres homens. Se não estão babando por nós, se tiram o dia para meditar ou para assistir um jogo de vôlei na tevê sem avisar com duas semanas de antecedência, danou-se: aí tem. Autor desconhecido

A vogal "i" quer ir embora

Oi! Eu sou um “i”. 
Como “i” que sou, a nível de vogal que sempre serei, sinto-me injustiçada e revoltada. 
Por que que é de todo alfabeto só nós temos que carregar essa bolinha ridícula!? Não quero mais usar. 
É por isso que na próxima encadernação, eu quero vim letra “a”. 
É, porque o “a” pode usar todos os acentos que quiser: vira pra lá é crase, vira pra cá é acento agudo, pega um resfriado, põe um chapeuzinho, quer dá um lance põe um til, fica toda tchan. 
Gora então que ela virou símbolo mundial da internet, tá toda arroba, toda boba! Letra metida! Muito difícil a convivência aqui nesse alfabeto! 
Foi por isso que eu estou de malas prontas, para abandonar a Língua Portuguesa. 
Eu... tava pensando então de ir para os Estados Unidos... só que lá para você tirar som de “i”, só sendo ipsilone. Eu também não tô a fim de me vender a esse ponto. Aí o “ó”, que é o “ó”! 
Ele sugeriu que eu fosse pra Alemanha, mas gente, lá tem trema. Já pensou se ao invés de uma eu tiver que carregar duas bolinhas? Então não sei, sabe? Porque se eu ficar aqui, qual vai ser o meu futuro? 
Virar diminutivo na boca desses casaizinhos melosos, hein hen hen... Se pelo menos na hora da sacanagem eles me usassem! Mas não! Eles usam todas as vogais: Aaaaaahhhhhhh! Eeeeeehhhhhh! AAAAaaaa! UUUUUuuuuuu! Quando fala iiiiiiihhhhhh! É porque o cara! Ó.... 
Poxa! Sabe, eu também não quero ficar morando nestas siglas antipáticas tipo IPTU, ICMS e IR. Então, agora eu vou me embora, vocês vão ver como é difícil ficar sem o “i”. 
 Nunca mais vocês vão poder fazer xixi, só coco! 
 Também nunca mais vão poder se cumprimentar dizendo: Oi! Como vai? 
Só vão poder se despedir, como eu estou fazendo agora, dizendo: Até logo! By! By! Tchau! Tchau!

 Texto do Grupo "Os melhores do mundo"

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Autografando


No lançamento cerca de 60 autores-participantes de diversos estados assinaram o livro. Além deles, participaram o escritor Moacyr Scliar, que escreveu o primeiro capítulo e Maurício de Sousa, responsável pela capa. Rosely Boschini (CBL), Hubert Alquéres (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo) e Sérgio Valente (DM9 DDB) foram os presidentes das respectivas entidades que participaram do projeto que mobilizou centenas de escritores anônimos e renomados durante todo o mês em que o site ficou no ar. Larissa Cristine Gomes, de 11 anos, a mais jovem dos autores diz que caprichou muito na história para ser uma das escolhidas. “Essa foi minha primeira experiência como escritora. Tenho vontade de escrever mais histórias como essa”, diz. Sem saber como a história que começo a escrever terminaria, Moacyr Scliar disse que o resultado ultrapassou todas as expectativas. “Vários fatores levaram ao sucesso do Livro de Todos: a idéia é muito boa; foi tudo feito da maneira certa – usando a Internet; e o projeto tem atrás de si a Câmara Brasileira do Livro e a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo”. Pelo sucesso que foi. Scliar acredita que o modelo possa ser adotado em todo o País a qualquer hora. A Presidente da CBL, Rosely Boschini, reforçou a tese de Scliar. “Se havia alguma dúvida entre a Internet e o livro impresso, essa se desfez aqui, com o lançamento do Livro de Todos, uma obra escrita com a participação de 173 internautas”. “O entusiasmo desses novos autores prova que as pessoas gostam sim de ler e de escrever e que basta darmos a oportunidade e resultados impressionantes como este do Livro de Todos aparecem”, comentou Hubert Alquerés, presidente da Imprensa Oficial. Sérgio Valente, presidente da DM9 DDB, disse que o livro é uma ótima idéia e idéias assim se realizam com a colaboração de todos. Sobre o lançamento, disse que “nunca uma sessão de autógrafos teve tantas assinaturas”. O Livro de Todos foi idealizado especialmente para esta edição da Bienal do Livro e escrito em um mês. Aso todos mais de 14 mil visitas ao site e 362 colaborações de 173 autores-participantes. Todos os textos enviados foram avaliados, selecionados e editados por uma comissão editorial da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, supervisionada pelo jornalista Almyr Gajardoni. Os visitantes da Bienal do Livro de São Paulo que passarem pelo estande da Imprensa Oficial podem adquirir o livro por R$ 5.

20ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo

Sábado, 16 de Agosto
Lançamento do Livro de Todos - O mistério do texto roubado

Mais de 400 pessoas lotaram o estande da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo para o lançamento do Livro de Todos - O mistério do texto roubado, a primeira obra coletiva escrita pela Internet no Brasil. 
No maior lançamento da Bienal do Livro, cerca de 60 autores-participantes de diversos estados assinaram, orgulhosos, o livro. Além deles, participaram o escritor Moacyr Scliar, que escreveu o primeiro capítulo; Maurício de Sousa, responsável pela capa, e ainda os presidentes das entidades envolvidas no projeto que mobilizou centenas de escritores anônimos e renomados durante todo o mês em que o site ficou no ar: Roseli Boschini (CBL), Hubert Alquéres (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo) e Sergio Valente (DM9 DDB). Larissa Cristine Gomes, a mais jovem dos autores, chegou ansiosa para o lançamento no começo da tarde e só acreditou que era de fato uma escritora quando a festa acabou. 
"Foi muito mais do que eu imaginava. Agora a ficha caiu de verdade e estou adorando a minha primeira experiência como escritora", disse a garota de 11 anos. Sem saber como a história que começou a escrever terminaria, Moacyr Scliar disse que o resultado ultrapassou todas as expectativas. "Vários fatores levaram ao sucesso do Livro de Todos: a idéia é muito boa; foi tudo feito da maneira certa -usando a Internet; e o projeto tem atrás de si a Câmara Brasileira do Livro e a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo". 
Pelo sucesso que foi, Scliar acredita que o modelo possa ser adotado em todo o país a qualquer hora. A presidente da CBL, Rosely Boschini, reforçou a tese de Scliar. "Se havia alguma dúvida entre o bom relacionamento entre a internet e o livro impresso, essa se desfez aqui, com o lançamento do Livro de Todos, uma obra escrita com a participação de 173 internautas". 
"O entusiasmo desses novos autores prova que as pessoas gostam sim de ler e de escrever e que basta darmos a oportunidade e resultados impressionantes como este do Livro de Todos aparecem", comentou Hubert Alquéres, presidente da Imprensa Oficial. Sérgio Valente, presidente da DM9 DDB, disse que o Livro de Todos é uma ótima idéia e idéias assim se realizam com a colaboração de todos. Sobre o lançamento, disse "nunca uma sessão de autógrafos teve tantas assinaturas".

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Nenhum a menos


Nenhum a Menos 
Gênero: Drama 
Ano de Lançamento: 1999 
Sinopse: Gao é o professor da Escola primária Shuiquan e precisa sair de licença para cuidar da mãe doente. Num lugar distante e pobre, a única pessoa que aceita substituir o professor é uma menino de 13 anos, Wei Minzhi. Como a evasão escolar é muito grande, Gao intrui Wei a não permitir que nenhum de seus alunos abandone o curso prometendo-lhe 10 yuans extras em seu pagamento. Perdida em meio às crianças, Wei faz de tudo para manter os alunos na escola, até que um garoto de 10 anos é obrigado a partir para a cidade em busca de trabalho. Para trazê-lo de volta, Wei inicia uma incansável jornada à procura de seu aluno na cidade grande. 

Assisti ao filme “Nenhum a menos” e brotou em mim certa indignação pelo sistema. Aliás, a coisa mais fácil é o sistema nos indignar! O filme conta uma história ocorrida na China, numa vila, povoado, no campo. Um professor de crianças do lugar tem que viajar, e ficará fora por um mês, então, o administrador do povoado, contrata professora uma substituta - uma menina de 13 anos. A garota não tem experiência nenhuma e só aceita o convite porque lhe prometem um pagamento pelo mês de trabalho. 
A realidade do lugar não é muito diferente do que acontece no 3º mundo: escola dilapidada, sem materiais escolares, espaço físico ínfimo, mobiliário caindo aos pedaços e o velho giz que passa a ter valor de melhor recurso didático, porque não dizer único! Pois, nem a saliva da professora poderia educar aquelas crianças, já que não tinha conhecimento para tanto. 
A narrativa flui em torno da atitude da professora em querer manter as crianças na escola, pois só receberá o pagamento se quando o professor voltar não tiver faltando nenhuma criança, ou seja, deverá entregar a turma com “nenhum a menos”, algo que não difere do nosso país atualmente. Estamos acompanhando ações do governo em manter as crianças na escola, nesta ação governamental estão intrínsecas duas vertentes de como isso pode ter objetivos diferentes: manter crianças nas escolas estabelece índices e parâmetros de dados estatísticos para “inglês ver”, por outro lado prega-se a política da “criança na escola”, mas será que estão lá de corpo e alma, ou só de corpo? 
O acesso ao conhecimento não é o objetivo principal, mas a manutenção dos dados numéricos que o governo não quer para o país, mas para ofertá-lo ao FMI. Na narrativa, um garoto foge, em busca de trabalho, pois o pai havia falecido, a mãe estava doente e ele precisava ajudar a família a pagar as dívidas. A professora começa sua luta em busca da criança, da ovelha desgarrada que fora para a cidade. Não tendo dinheiro nem para a passagem, as crianças trabalham carregando tijolos para juntar dinheiro o suficiente, no intuito de que a professora possa buscar o garoto de volta. A máxima do filme é a propaganda da Coca-Cola, as crianças estão com sede e a professora para em um mercado e compra 2 latas de Coca-Cola para que as crianças experimentem, pois nem ela conhecia o gosto. 
São 26 crianças e com a professora 27, todas tomam cada uma, um gole apenas, não saciam a sede, mas saboreiam o gosto do desconhecido, uma experiência nova... algo que professores deveriam levar todos os dias às suas salas de aula: experiências novas. 
 O ponto forte destacado no papel da professora se dá, quando, por causa da falta de dinheiro coloca as crianças para fazerem contas sobre quanto deverá ter para buscar o colega que está perdido na cidade. E a matemática parece fluir bem entre as crianças. A busca da professora tem final feliz, mas observamos sua falta de experiência em várias situações e sua sabedoria em outras. Ela consegue ao final entrar na TV local e, comovido com sua história, o administrador da TV, leva ao ar uma reportagem sobre educação e escolas das zonas rurais, e em entrevista ao vivo, a professora apela para encontrar a criança. 
O desfecho vai além do esperado, pois além de conseguir encontrar o aluno perdido, ela consegue comover a população que manda materiais escolares, dinheiro e vários recursos para a manutenção da escola. A metáfora do filme fica por conta do giz colorido, material nunca visto nem pela professora e nem pelas crianças. Então, a professora deixa as crianças escolherem uma cor de giz e irem ao quadro escrever uma palavra. A criança menor que ainda não sabe ler e escrever desenha somente uma flor. 
O filme faz-me lembrar das utopias vividas no magistério por conta da educação brasileira, quando sonhava em ter em salas de aulas crianças para serem educadas não pelas condições do filme e nem pelas vividas no nosso país em decorrência do Capitalismo ou da chamada Globalização. Não sonhava que as crianças tivessem que ser estatísticas de um mundo selvagem. “Nenhum a menos” deveria ser um desejo do coração de cada brasileiro e não uma obrigação jurídica e governamental do Ministério público, dos Conselhos Tutelares, das Bolsas Escolas, dos Salários Educação, etc, etc... Manter a criança na escola não deveria ser meio e sim, um fim.