quarta-feira, 25 de junho de 2008

Orgulhosa

Na época de Trasíbulo era comum encerrar as festas com alguém declamando uma poesia acompanhado pelo piano. A poesia A ORGULHOSA, tem a sua história; dizem que foi declamada de improviso no baile de formatura de outro poeta - Péthion de Vilar. Reza a crônica oral que a recepção oferecida pelos pais de Péthion, diplomado em Medicina, naquele ano de 1895, já estava pela metade da noite quando, instado pelo próprio Péthion, seu velho amigo e jornalismo, banco acadêmico e vida literária, Trasíbulo, que chegara quando a festa já ia ao meio e, como sempre, descabelado com traje surrado e calçado com cadarço desamarrado, havia se recolhido à sacada de uma das janelas do palacete que dominava o largo de São Pedro, ensimesmado e abatido com a taboca (recusa) que sofrera por parte de uma das irmãs de Péthion, quando ele se dirigira e a convidara para uma contradança. A jovem, que alegara para efeito de recusa o fato de se achar indisposta, momento depois, aceitava o convite de um dos seus primos. 

Autor: Trasíbulo Ferraz Moreira 

Deixa-te disso, criança, 
Deixa de orgulho, sossega, 
Olha que o mundo é um oceano 
Por onde acasos navega. 
 Hoje, ostentas nas salas 
 As tuas pompas de gala, 
 O teus brasão de rainha; 
 Amanhã, talvez, quem sabe? 
 Esse teu orgulho se acabe, 
 E seja-te a tua sorte mesquinha. 

 Deixa-te disso, olha bem! 
 Que a sorte dá, nega e tira; 
 Sangue azul de vós fidalga, 
 Já neste século é mentira. 
 Todos nós somos iguais; 
 Os grandes, os imortais; 
 Foram plebeus como eu sou. 
 Ouve mais esta lição: 
 Grande foi Victor Hugo
Grande foi Napoleão, 

De nada vale nobres famílias, 
 A linhagem pura de vós! 
 Se o sangue do rei é puro 
 é o mesmo que corre em nós! 
 Agora a pouco pedi-te, 
 Pedi-te para valsar... 
 Tu me disseste não! 
 - és plebeu, és pobre; 
 e não me quiseste aceitar! 

 No entretanto, ignoras aquele que tanto te adora, 
 Que te conquista e seduz, 
 Embora seja da "nata", 
 É plena figura chata, 
 É fósforo que não dá luz! 

Agora sim, já é tempo 
 De dizer quem sou eu, 
 Um moço de vinte anos 
 Que se orgulha em ser plebeu, 
 Um lutador que não cansa, 
 Que ainda tem esperança 
 De ser mais do que hoje é, 
 Lutando pelo direito, 
 Para esmagar o preconceito 
 Da fidalguia sem fé! 
 O que é belo e sempre novo 
 É ver um filho do povo 
 Saber lutar e subir, 
 De braços dados com a glória, 
 Para o Plantheon da História, 
 Para conquistar o porvir. 

 De nada vale o que tens 
 Que não me podes comprar; 
 Ainda que possuístes 
 Todas as pérolas do mar! 
 És fidalga? 
- Eu sou poeta! 
 Tens dinheiro? 
- Eu tenho uma completa 
 Riqueza no coração; 
 Não troco uma estrofe minha 
 Por um colar de rainha 
 Por um troféu de latão. 

 Por isso quando me falas, 
 Com esse desdém e altivez, 
 Rio-me tanto de ti, 
 Chego a chorar muita vez. 
 Chorar sim, porque calculo, 
 Nada pode haver mais nulo, 
 Mais degradante e sem sal 
 Do que uma mulher presumida, 
 Tola, vaidosa, atrevida. 
 Soberba, inculta e banal.

Um comentário:

Jailda Galvão Aires disse...

Ouvi meu pai declamar esta poesia e todos os filhos a decoraram. Meu pai nasceu em Brejões próximo a Amargosa. Ele contava a mesma história narrada no seu Blog. Parabéns pela autenticidade.
Algumas pessoas, erroneamente, atribuem a outros autores inclusive Castro Alves.
Um grande abraço.